sábado, 22 de janeiro de 2011

"Ser separado da família com 11 anos de idade me marcou profundamente para o bem e para o mal"

Ele é meu melhor amigo desde antes do ex-SIC. Muito mais racional que emocional, chega a ser contundente (ou seria sarcástico?) no que escreve.

Reservem bastante tempo para leitura da entrevista, pois caso queiram seguir os "links" que ele inseriu nas respostas, "a coisa vai longe".

Não posso dar mais dicas. O motivo vocês saberão logo abaixo.
  • Quando entrou para o ex-SIC?
No início de 1962
  • De que cidade/paróquia?
Paróquia Nossa Senhora do Amparo de Amparo-SP
  • Por que entrou para o seminário?
Minha professora do 3o. ano primário era muito ligada à Igreja. Como eu era bom aluno, e bem comportado, ela me convidou para ser coroinha, já com segundas intenções...rsrs
Quando iniciei o 4o. ano ela convidou-me para ser seminarista e, para isso, iniciar o curso de preparação para o exame de admissão. “Fui no embalo” e aceitei. Lembro-me que uma das razões foi terem me dito haver no seminário um bonito campo de futebol e sua prática diária...rsrs
  • Quantos anos tinha quando entrou?
11 anos
  • Quando saiu do ex-SIC?
Em 1967
  • Quantos anos tinha quando saiu?
17 anos
  • Por que saiu do seminário?
Foram várias as causas, difíceis de explicar. Mas a principal foi a ânsia de liberdade. Neste ano (1967) passamos a estudar no Pio XII, pela manhã, e voltávamos a tarde para as aulas de Grego e Latim. Toda segunda-feira era a mesma história: Nossos colegas contavam sobre tudo o que tinham feito no final de semana. E nós? Não tínhamos muito o que contar. Cada passo era vigiado por alguém. Cada saída tinha que ser justificada para alguém. Como, além de "caxias", nunca fui um mentiroso competente eu nada fazia fora das regras para não ser "pego na mentira". Alguma paquera? Nem pensar.
Decidi que, definitivamente, essa não era a vida que eu queria. Isso foi no primeiro semestre. Mas fiz o sacrifício de esperar até o final do ano escolar.
  • O que aprendeu no ex-SIC?
Excelente formação escolar, noções de hierarquia, organização, civilidade e treino para falar em público. As apresentações no grêmio e academia me deixavam agoniado, mas foram importantes para eu perder a inibição de me expor em público. Porém, o mais importante foi descobrir o companheirismo dos colegas e o início de amizades que foram retomadas mais de 30 anos depois.
  • O que faltou aprender?
Aprender a tratar os serviçais como pessoas e não como “mobiliário”. “Não mantenham conversas com os empregados”, foi um dos avisos que recebemos. Só após sair do seminário é que fui saber o motivo. Mas, aí o “pepino já estava torto”. Sem nenhuma alusão ao motivo...rsrsr
  • O que fez depois que saiu? Estudou o que?
Terminei o clássico em Amparo. Tentei a vida em S. Caetano do Sul, mas como estava na idade de servir o exército, não consegui emprego. Voltei para Amparo, servi o “tiro de guerra” e perdi um ano de minha vida escolar, além do dilema de servir o exército imediatamente após o AI-5.  Voltei para o ABC paulista, fiz cursinho para vestibular de economia, fiz faculdade de Matemática e Especialização em Análise de Sistemas, ambas na Fundação Santo André.
  • Qual sua trajetória profissional após a saída do ex-SIC?
Meu primeiro trabalho remunerado foi numa gráfica em Amparo (Curiosidade: Um dos proprietários da gráfica era irmão do Osnir Zocchio). Passava o dia todo arriscando ter meus dedos prensados numa impressora tipográfica. Depois fui trabalhar em uma fábrica que produzia chocadeiras para ovos. Ainda durante o serviço militar comecei a trabalhar no Comind (primeiro em Amparo e depois em S. Caetano do Sul). Já aviso aos engraçadinhos que não participei da “quebra” do banco. Ele “quebrou” muitos anos após minha saída. Saí do Comind para ser fiscal de água no DAE-SCS (São Caetano do Sul). Foi onde entendi o “espírito” de funcionário público (Meu chefe me dizia: “Não faça hoje o que você pode deixar para amanhã”...rsrsr). Trabalhei na DERSA durante a construção da rodovia dos Imigrantes. Ali entendi o “espírito” de uma empresa estatal (O secretário dos transportes era o "Candidato mais ficha limpa do Brasil"). Saí após a inauguração do trecho do planalto. Entrei na área de Tecnologia da Informação (naquele tempo chamava-se Processamento de dados) do Banco Real, como analista de sistemas, e lá fiquei por 30 anos até que em 2006 a área de desenvolvimento de sistemas foi terceirizada com uma empresa indiana de produção de "software". E eu fui "terceirizado" junto. A empresa teve que nos "aceitar" com as mesmas condições que tínhamos no banco.
Entre 1985 e 1991 exerci atividade paralela como professor de Modelagem de Dados na Faculdade Renascença.
  • Trabalha ainda?
Quando fui “terceirizado” eu já estava aposentado pelo INSS. Achei que não iria ficar nem 3 meses na nova empresa, pois estabeleci algumas condições (só trabalhos de consultoria) para continuar. Para minha surpresa os indianos aceitaram e me mantém até hoje. Acabei descobrindo que na empresa anterior eu fazia parte do “centro de custo” e nesta faço parte da “matéria prima”...rsrsr
  • Casou? Tem filhos? Netos?
Casei-me em 1982 e depois de 20 anos descasei (Redescobri a liberdade...rsrsrs).
Hoje tenho uma companheira, Ruth, porém cada um na sua casa...rsrsrs.
Do casamento resultou um casal de filhos. O Vinícius, mestrando em Física e a Patrícia, psicóloga, ambos solteiros. Até o momento sem netos.
  • Quais as recordações mais marcantes do tempo de ex-SIC?
Foi a rígida disciplina que encontrei lá, e que foi sendo “aliviada” ao longo dos anos. Quando entrei, era obrigatório utilizar blusa de manga comprida na capela e no refeitório, não importando o calor que fizesse. Tínhamos que fazer as refeições em silêncio absoluto. As visitas às nossas casas eram uma vez por ano. No final tudo isso já estava liberado e as saídas eram a cada 2 ou 3 meses. Para os que moravam em Campinas, era todo final de semana. Entre uma época e outra houve o Concílio Vaticano II e um pouco de racionalidade econômica.
Outras recordações, divertidas, são algumas histórias que deixei registradas na página “Memórias e histórias” do nosso “site”.
  • Cite um personagem com quem conviveu na época e que o impressionou positiva ou negativamente.
Quem mais eu admirei e teve grande influência na minha vida foi, sem dúvida, o Pe. Sena. Em uma publicação que postei no nosso "blog" em 13/12/2008 (O dia que o passado invadiu meu presente) vocês poderão ler mais detalhes do quanto ele me influenciou.
  • Sobrou alguma mágoa? Qual?
Não. Não sobraram mágoas. Não costumo cultuar o passado. Recordar o passado só serve para explicar como e porque eu cheguei até o presente. Sempre há coisas boas e ruins a lembrar. Se fixo-me nas lembranças boas torno-me “saudosista”. Se fixo-me nas lembranças ruins torno-me “amargo”. E ambas ajudam quase nada a viver o presente e planejar o futuro. Portanto, procuro não gastar tempo demais nem com umas, nem, muito menos, com as outras.
  • Se voltasse no tempo iria novamente para o ex-SIC? Por que?
Esta pergunta só faz sentido ser respondida levando em conta que já conhecemos o que se passou. Sendo assim, não iria novamente para o ex-SIC, pois isso eu já sei como termina, pelo menos até o momento. Preferia arriscar outra trajetória independentemente se fosse melhor ou pior.
  • Quais as principais mudanças que a entrada (e/ou saída) do seminário provocou em você?
Ser separado da família com 11 anos de idade me marcou profundamente para o bem e para o mal. E quando sai, foi um alívio descobrir que eu não era mais obrigado a seguir uma série de normas, cerimônias, liturgias e práticas religiosas nas quais eu não via o mínimo sentido.
  • Dedica-s à Igreja Católica atualmente?
Não. Apenas compareço caso haja algum evento social.
  • Qual sua relação com a religião atualmente?
Desde a época do seminário eu sempre me esforcei para descobrir onde está a essência das coisas (Isso foi reforçado pelo Mons. Luiz de Abreu. Fiz um discurso na Academia S. Tomás de Aquino sobre “Desperdício”. Nos comentários, ele me surpreendeu ao dizer que aquele havia sido o melhor dos 4 discursos da noite porque tinha ido ao âmago do problema). Sempre direciono meus esforços em concentrar no essencial, desprezando os acessórios. Em relação à religião cheguei à conclusão de que a essência está em “Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo”. Como o “Amar a Deus sobre todas as coisas” é algo um tanto abstrato (e penso que Deus não deve estar muito preocupado com isso...rsrsrs) o que sobra de concreto é: “Amar o próximo como a si mesmo”. Tenho a convicção de que nossa principal, se não a única, missão na terra é essa. E confesso que é muito, muito difícil! Principalmente quando este próximo é nosso inimigo declarado ou velado. Mas, mesmo sendo difícil, fujo à tentação de encontrar compensações em religiões, rituais, ou que tais. Alguém pode argumentar que a religião é que dá forças para alcançar este objetivo. Pode ser, mas das que conheço, a que é mais focada nisso não é religião. É uma doutrina. Não sou espírita, mas simpatizo com seus fundamentos e ideais. Seus conceitos de livre arbítrio, lei de causa e efeito e reencarnação são mais palatáveis ao meu raciocínio. Explicam uma série de situações aparentemente sem sentido. Seus pontos de convergência com a "Teoria M" são notáveis (seriam as várias dimensões os planos espirituais?) . “Se non é vero, é bene trovato”(“Se não é verdade, é bem contado.")
  • Como você compara a sua religiosidade daquela época com a atual?
Antes eu “cumpria tabela”. Assistia às missas, até participava, rezava o terço e vivia repetindo mecanicamente uma série de atividades, mesmo sem ver muito sentido naquilo. Hoje imagino que seja mais objetivo e, espero, estar no caminho certo. Nem quero imaginar que esteja no caminho errado, pois, nesse caso, arderei eternamente(!?!?!) no fogo do inferno!...rsrsrs
  • Como você compara a Igreja Católica daquela época com a atual?
Quando entrei no seminário era a igreja pré-Concílio Vaticano II. O Concílio provocou uma grande mudança numa estrutura que estava sedimentada já há quase um século. E como toda mudança sempre há um certo tempo até “acertar o alvo”. É como sintonizar analogicamente uma emissora de rádio. As vezes fica aquém da sintonia ideal, às vezes vai além, até uma hora que acerta. Acho que ainda está, dentro dos seus propósitos, procurando a sintonia ideal.
  • O que você acha dos reencontros com os ex-colegas do ex-SIC?
São a grande chance de redescobrir que somos uma comunidade com fundamentos comuns. Por vários anos nos dispersamos. Cada um foi “construir” sua vida. Agora, já "maduros", voltamos a nos encontrar para retomar a amizade, dentro de outros parâmetros e de outra realidade.
  • Alguma sugestão?
Minha sugestão é que cada um que esteja lendo estas respostas contate e incentive algum colega ex-SIC “desgarrado” a se engajar nesta comunidade. E, como nossa "Pizza do Paierão", que outros encontros regionais sejam organizados periodicamente
  • Qual pergunta você gostaria de ter respondido e que não foi feita?
É uma pergunta que só poderia ser feita agora: O que você acha da série de entrevistas publicadas?

Acho que superaram em muito minhas expectativas. Houve pérolas que ficariam no ostracismo caso não houvesse esta oportunidade.
Percebi ainda que vários colegas que sentiam ter vocação foram "convidados" a sair do seminário e eu, sem vocação alguma, instado a ficar/voltar. (Quando fui me despedir do Mons. Bruno ele disse que as portas estavam abertas e que eu "desse um tempo" e voltasse). O que será que provocava esta "contradição"? Será porque eu era muito disciplinado e "quadrado"? Fica aqui uma pergunta para quem quiser arriscar-se a responder.

  • Há algum outro endereço na internet que tenha mais informações sobre você? Algum "link" que você queira divulgar?
Além dos “links” citados acima (Memórias e histórias e O dia que o passado invadiu meu presente), há um que eu já havia divulgado há uns 2 anos. Trata-se do relato de como “encontrei-me” com o apóstolo São Tomé, devidamente registrado em foto para eliminar qualquer descrença...rsrsrs.

Quem quiser ler (ou reler) estes são os “links” (não esquecer de ver as fotos e ler os comentários, pois as provas, e parte da história, estão lá).

Parte 1:
http://indiagestao.blogspot.com/2009/01/uma-semana-em-chennai-ndia-parte-1.html

Parte 2 (final):
http://indiagestao.blogspot.com/2009/01/uma-semana-em-chennai-ndia-parte-final.html

Fotos:
http://picasaweb.google.com.br/j.reinaldo.rocha/UmPoucoDeChennaiNdia#
  • Alguma mensagem especial aos outros ex-SIC?
Só tenho a agradecer aos que aceitaram o convite e despenderam seu precioso tempo para responder estas perguntas. Também entendo os que não quiseram respondê-las, pois hoje descobri o quanto algumas perguntas são difíceis de serem respondidas.

José Reinaldo Camilotti da Rocha

Pois é. Ele sou eu! (Ou seria meu "alter ego"?)

Posso ter sido um pouco provocativo para que vocês encham o "blog" de comentários, mas fui bastante sincero.

Sem comentários anônimos, por favor. Identifique-se caso o faça como anônimo.

Esta pode ter sido a última entrevista a ser publicada nesta série. Agora aguardaremos as respostas dos que prometeram que iriam responder e ainda não o fizeram. Assim a periodicidade dependerá do fluxo de chegada de eventuais novos entrevistados.

Muito obrigado a todos que participaram; ou tiveram vontade de participar e não puderam.

Aproveito para incitar a quem queira utilizar este espaço para publicação de assuntos de interesse da comunidade que o façam. Basta enviar o texto para ex.sic.1955@gmail.com que publicaremos com o maior prazer.

Até quando surgir algum assunto que mereça publicação.

J. Reinaldo Rocha(62-67)

P.S. Minutos antes de eu postar esta publicação, vi que o Zago fez comentários dos comentários feitos sobre sua entrevista. Leiam que vale a pena! Basta procurar pelos comentários na entrevista dele. Pode ser acessada clicando sobre seu nome (José Antonio Zago) na lateral direita desta página.

sábado, 15 de janeiro de 2011

"Ficar sozinho, longe de familiares, de apoios específicos que somente a família pode fornecer, pode ser uma fonte de amadurecimento (às vezes precoce)."

 Lembro-me dele, super concentrado e compenetrado, recitando "O navio negreiro" no palco do seminário. Depois utilizou esta característica e tudo o mais que aprendeu no ex-SIC para construir uma fecunda vida profissional que culminou num importante trabalho social.


Suas respostas estão repletas de recordações factuais, incluindo a citação dos personagens. Um deles, leitor, poderá ser você. Será? Isso você só saberá lendo-as até o final

  • Quando entrou para o ex-SIC?
Em 1961. Fiz o exame para a primeira série e não passei e assim tive de cursar o Admissão.
  • De que cidade/paróquia?
Paróquia de Santo Antonio de Itapira.
  • Por que entrou para o seminário?
O pároco da Matriz de Santo Antônio era o Padre Matheus, recém-saído do Seminário aonde havia sido Orientador de Disciplina (era esse mesmo o nome?) e isso talvez o tenha estimulado em trabalhar com os coroinhas sobre o ingresso no Seminário. Itapira, como outras cidades, enviou um grande número de crianças e adolescentes. Quando fui para o Seminário já se encontravam lá o Butti (Padre Butti infelizmente precocemente falecido quando exercia seu sacerdócio em Araras, SP) e o Nereu (mais antigos), mas também o Anísio Moraes, o Cidinho Osti, o José Ítalo Silvestrim (poeta), o Joel Vidotto, O Leão Amorim, o Laércio Turolli. Depois, o Antonio Costa Machado (Costinha), o Glauco Ceragiolli, o Sérgio Risola (hoje vive em Brasília), os irmãos Moraes, o Giovelli (Nikita Bambu) Hélio Citrângulo. Será que esqueci de alguém? Eu estava nesse meio.
  • Quantos anos tinha quando entrou?
Com 12 anos. O quê sabia de opções ou escolhas na vida?
  • Quando saiu do ex-SIC?
Em meados de 1965.
  • Quantos anos tinha quando saiu?
16 anos.
  • Por que saiu do seminário?
Fui aconselhado pelo padre Vanim. Fazia muita bagunça, vivia sendo repreendido. No fundo considerava que não tinha mesmo vocação. A cada retorno de férias ficava mais difícil voltar; o mundo de fora se apresentava muito sedutor no sentido de ser mais aberto e de mais opções.
  • O que aprendeu no ex-SIC?
Muito e muito. Mesmo não sendo um aluno de ponta (para se usar um termo atual) tal como eram considerados o Gessé e o Gérson, tudo contribuiu no que se refere à educação ao estudo. Para se ter uma idéia quando fui fazer o Colegial no Instituto de Educação Elvira Santos de Oliveira de Itapira, considerado um dos melhores da região da Mogiana, era como passar faca quente na manteiga. O estudo diário, o estudo dirigido, as pesquisas, feiras de ciências e de letras que participávamos, o aprendizado dos primeiros anos de Latim, enfim, foi de fato uma base sólida para a vida acadêmica posterior.
  • O que faltou aprender?
Creio que dentro da proposta do Seminário, estava tudo completo, já que o objetivo era a formação de padres. Temos que ver dessa ótica. O Seminário não era uma escola comum. Era mais que isso. O compromisso não era apenas com o estudo, mas, além dele, sobretudo, com a vocação.
  • O que fez depois que saiu? Estudou o que?
Por um tempo fiquei parado, sem rumo. Penso que esse deve ter sido um problema comum dos que saíram do Seminário. Você sai, não tem amigos ou referências de colegas, de locais de freqüência, etc. Por um tempo continuei indo à Igreja como se fosse um seminarista. Depois, a gente foi constituindo uma nova rede de relacionamento, principalmente na vida escolar. Mas, no meu caso, embora tenha participado de teatro no Seminário, concursos do Grêmio Literário Dom João Batista Correa Nery (ganhei dois prêmios de declamação; uma com Pássaro Cativo de Bilac e outra com A Fazenda (não lembro o autor). O Navio Negreiro que Rocha menciona, foi declamado numa peça de teatro apresentada num Dia das Mães. Os prêmios do concurso foram um passeio a uma livraria da cidade para escolha de um livro. Num escolhi Sem Família e no outro concurso (que fiquei em segundo lugar) A Cabana do Pai Tomas), me sentia muito tímido, recatado e demorou um bom tempo para entrosar e conviver dentro de alguns valores diferentes daqueles existentes no Seminário.
  • Qual sua trajetória profissional após a saída do ex-SIC? Trabalha ainda?
Por um tempo fiquei parado, sem saber o que fazer. Servi o Exército (na confissão de Páscoa dos soldados fiz minha confissão com o Padre Canoas). No Exército encontrei também com o Flademir Castelani (era profundo conhecedor de orquídeas), que servia na mesma Bateria. Depois, fui trabalhar em um conhecido Hospital Psiquiátrico da cidade. Aí descobri minha vocação (“De médico e louco todo mundo tem um pouco”). Cursei Psicologia na Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP), aonde também fiz o Mestrado em Educação (comecei o Doutorado, mas abandonei para me dedicar à clínica). Assim que me formei lecionei por cinco anos na UNIMEP e em 1978 também lecionei na Faculdade de Medicina de Itajubá, MG. Na UNIMEP reencontrei duas pessoas da época de Seminário: O Bressanzinho, que foi para lá lecionar Psicologia Organizacional e o Padre Nadai que havia feito Mestrado em Abordagem Centrada na Pessoa na Gregoriana de Roma. Não chegou a lecionar para minha turma, mas mantivemos contato durante o período em que esteve em Piracicaba. Em 1983 fui convidado a trabalhar no conceituado Instituto Bairral de Psiquiatria (o mesmo hospital que descobri minha vocação). Neste hospital desenvolvemos um trabalho modelar no campo do tratamento das dependências de álcool e outras drogas. Desde então, tenho dedicado a esse campo. Produzi textos (livro e cerca de 40 trabalhos científicos) sobre o tema. Foi no final dos anos 90, ao trabalhar num projeto de prevenção do município que revi o Valdemar Sibinelli em Campinas na EPTV. Em 2005, já aposentado (aposentei em 1995), o Secretário de Saúde do Município de Itapira convidou-me para implantar o Centro de Atenção Psicossocial para Dependentes de Álcool, Tabaco e Outras Drogas no município. Fiz pós-graduação em Saúde Mental pela UNICAMP e estamos nesse trabalho de ajuda aos dependentes de drogas desde então. Temos preocupado mais recentemente com o envolvimento de crianças e adolescentes na questão das drogas, os quais constituem não apenas usuários, mas que traficam para os adultos que se escondem sob a fragilidade dessas crianças. Estamos firmes nesse caminho.
  • Casou? Tem filhos? Netos?
Casei em 1980 com a Heloisa que também é psicóloga. Tenho dois filhos, a Danielle que é fisioterapeuta e o Gabriel que é formado e trabalha em Ciências da Computação. Não tenho netos.
  • Quais as recordações mais marcantes do tempo de ex-SIC?
Uma das coisas que me fascinava era o Setor Rádio desenvolvido, entre outros, pelo Veríssimo (Cônego Veríssimo), pelo Jamil Sawaya (narrador esportivo) e o Felício, o grande comentarista e conhecedor de esportes. Eu gostava de contribuir, mas era barrado pelo fato de ser um médio e eles serem dos maiores. Gostava de participar de jornal da classe ou do jornal do Seminário que o Veríssimo coordenava. Se não me falha a memória o nome do jornal mural era O Recreativo; o da classe era O Arauto. Essa vontade de escrever de participar de teatro foram fundamentais na vida quanto ao registrar minhas reflexões de meu trabalho e com isso produzido artigos.
Os sábados eram bons porque as aulas eram suspensas, mas havia a limpeza: lavagem, rodo, escovão, etc. Quando a gente pegava aquele imenso refeitório...
Os domingos eram legais até o final do jogo da tarde, geralmente uma das equipes do Seminário contra uma equipe de fora. Mas, depois, era uma tristeza.
A época de junho era um frio de fazer rachaduras nos lábios (como ventava no Paieiro! E aumentava muito o consumo de manteiga de cacau). Em junho havia a Festa Junina, recheada de fogos de artifícios gentilmente doados pela família do Mancini de Leme (Fogos Ypiranga). De lá do final do campo de baixo podíamos às vezes ver o Zé Marmita, lembram dele?
Refrigerante somente quando de festas dos maiores, médios e menores. Fora isso, a gente se enganava com sal de Fruta Eno porque parecia ter um gosto que lembrava vagamente o de uma sodinha.
Muito esperada era a Festa de Natal. Além dos enfeites do artista Zocchio, a festa (uma ceia permeada de músicas) era um atrativo principalmente para os menores, sem contar que no dia seguinte íamos de férias.
Tinha muitos companheiros com quem jogávamos o jogo de botões. Fazíamos campeonatos sobre uma mesa de pedra com bolinha redonda. Lembro de alguns colegas: o Passarinho, o Buffo, o Márcio, o Bélix, o Arnosti.
Todas as histórias que o Rocha narrou no espaço Ex-Sic de forma muito competente eu estava lá, já que fomos contemporâneos.
O futebol era outro ponto importante de grandes recordações. Joguei na Seleção de Médios, com Bizari, Laércio, Sales, Arnosti, Gerson (de Limeira), Buffo, Renato, Arthur, Rocha, Manoel, Caritá II, Peter, Correa, Pavan e outros. Também participei do seleto time do Corinthinha organizado pelo Paulo Afonso Proença Passarinho (falecido penso que em 1967 quando servia o BCCL quando arrebentou a sapata de um carro de combate provocando o acidente no qual perdeu a vida). Digo seleto porque o critério de escolha era pela amizade, além de saber jogar futebol, pois era e sou palmeirense. Lembro que nesse time jogava, além do Passarinho que era o dono e o ponta-esquerda do time, o Anilton Teberga, o Wiziack, o Davi, o Amstalden I, o Delgado (Piuca).
Havia um pessoal muito bom de música. O Cutuba (organista-mór), o Douglas também tocava bem piano. O Gesse era bom no violão e o conjunto musical que explodiu com a música Terezinha. Lembro que o Sawaya era o baterista e o Ditão saxofonista, além de ser o principal árbitro de nossos campeonatos internos. O Leôncio e o Caritá II certa vez formaram uma dupla. O Leôncio tinha um caderno com letras de músicas. Havia um grupo que gostava de poesia, dentre eles o Dutra e o Silvestrim. O Valim era um exímio orador da Academia T. de Aquino. O Benine, um fora de série no teatro.
  • Cite um personagem com quem conviveu na época e que o impressionou positiva ou negativamente.
Não lembro que alguém tenha impressionado negativamente. Positivamente foram vários: Mons. Luiz de Abreu, Padre Vanim, Padre Hugo, Padre Gaspar, Irmão Agostinho (do Latim), Padre Sena, Padre Leite, Mons Bruno (apesar de tremermos quando se anunciava sua presença, que nem sempre era anunciada, mas sim surpresa!), Cônego Luiz (não gostava de perder no ping-pong, mas era um grande contador de histórias), a Irmã Leonor, a Irmã Beatriz e a Irmã Tereza (professoras), os professores Luiz Rasera (até hoje não esqueço sobre um texto sobre a amizade que ele deu em francês de Antoine Saint Exupéry extraído de Terra dos Homens), o João Batista e o Lopes. Vários colegas de boas lembranças já citei no decorrer da entrevista.
Certa vez fui ao oftalmologista e quem me acompanhou foi o Paulo Aurélio Venturoli.
Já na minha vida profissional pude conhecer o Faur que foi diretor da Faculdade de Psicologia de Itatiba (Franciscana). Conversávamos sobre a vida de Seminário algumas vezes, e lembro-me que com Faur foram ordenados mais 13 padres (entre eles o Padre Canoas, o Padre Tinoco, o Padre Gastão) na Catedral de Campinas pelo Dom Paulo. Fui ministro do paramento (segurava os paramentos para o arcebispo) uma época, mas não me recordo se nessa ocasião ainda ou já havia sido. Infelizmente o Faur faleceu em plenitude profissional (sem contar é claro seus predicados de pessoa humana). Também, tive convivência com o Bruno Pucci na UNIMEP e um dia eu lhe disse que ele não me era estranho. Pois bem. Bruno foi Padre Estigmatino e várias vezes foi jogar no Seminário. Nós também íamos a passeio no Seminário deles onde havia um lago e um campo de terra. Hoje o Bruno coordena o Pós-Graduação em Educação da UNIMEP.
Nós recebíamos cadernos de capa amarela em cujo miolo havia escritos e desenhos sobre o átomo. Então eu chegava ao Lúcio (não sei se ele se lembra), pois não conseguia entender aquilo e pedia que me explicasse. Então, o Lúcio, sempre paciencioso, pegava uma folha seca de árvore e começava a cortar em pedacinhos até ficar com um pedacinho na mão e dizer que o átomo era a menor parte constituinte da matéria. Fácil de entender?
  • Sobrou alguma mágoa? Qual?
Não.
  • Se voltasse no tempo iria novamente para o ex-SIC? Por que?
Voltaria, mas não sei dizer o motivo. Foi um aprendizado e tanto. A vida no Seminário proporciona muitos momentos de solidão. Esta pode ser renovadora e alicerce de construção de valores. Ficar sozinho, longe de familiares, de apoios específicos que somente a família pode fornecer, pode ser uma fonte de amadurecimento (às vezes precoce). Mas, faria tudo novamente. Ter sido seminarista é um predicado que somente acrescenta positivamente em minha trajetória de vida. Percebo que em várias situações esse predicado abriu portas. Sabemos, todos nós, que o Seminário, se analisado por um vértice de fora dele, há muitas críticas. Mas, tais seriam injustas, pois agora somos bem mais críticos de quando estávamos lá. O Seminário não era o País das Maravilhas (em muitas ocasiões era o contrário), mas possibilitava um ingrediente fundamental para o crescimento interior (e que a juventude hoje está muito carente): o aprender a adiar (vejam bem, é ADIAR e não outra ação verbal completamente diferente e oposta). O Seminário, em suma, mais contribuiu com a formação do que atrapalhou.
  • Quais as principais mudanças que a entrada (e/ou saída) do seminário provocou em você?
Penso que respondi no decorrer de outras perguntas e especialmente na precedente.
  • Dedica-se à Igreja Católica atualmente?
Não.
  • Qual sua relação com a religião atualmente?
Ocasionalmente vou à Missa, quando sinto vontade de ir.
  • Como você compara a sua religiosidade daquela época com a atual?
Embora distante da Igreja, considero-me hoje mais religioso do que à época que tinha que ir à missa diariamente, por exemplo. Como já mencionou um colega em entrevista passada, nós convivemos no Seminário em meio à mudança do Concílio Vaticano II. Pensava numa reviravolta, mas parece-me que foi como um fogo de palha e que não se sustentou. Parece-me que a Igreja vive um outro ranço, embora diferente daquele da época legado por Pio XII. Considero que João XXIII foi o Papa mais sábio da Igreja nos últimos séculos, mas não teve sucessores à altura para conduzir em essência suas propostas de reformas. O Waldemar Sibinelli disse que a Igreja pisa na tábua e puxa o breque ao mesmo tempo e concordo com ele. O discurso da Igreja parece progressista, mas as ações que são ressonantes a esse discurso são sempre cerceadas. Quando há poder em jogo, tudo fica difícil. A Igreja tem poder? Qual? Hoje o Papa Benedicto faz um discurso mais antiquado ainda, mais de controle que de abertura. Parece que Papas Pastores independem de sabedoria acadêmica, mas são aqueles que aprenderam na vida.
  • Como você compara a Igreja Católica daquela época com a atual?
Penso que a Igreja de ontem tinha muitos problemas, graves inclusive. Mas, havia muito de positivo também. Alguém já mencionou e explicou aqui sobre a Liturgia nesse ponto. Os padres procuravam fazer não só crescer na questão da graça, mas também na de obras. Hoje, a Igreja teria condições de fazer muito e muito mais, mas parece bloqueada. Num domingo, 11 horas da manhã, aqui no interior, ganha um prêmio quem achar uma Igreja aberta. E nos dias de semana, então? Encontrar o padre, nem pensar! É mais fácil acertar na mega-sena. Há o dia certo de ele atender os fiéis. É preciso agendar, vejam bem, agendar se alguém deseja conversar com um padre. Há, assim, o dia certo do fiel necessitar do padre. O fiel que se vire. O padre se nivelou a um profissional liberal ou a um executivo de uma grande empresa. Na minha concepção, pode ser que esteja enganado, padre não é profissão. Ultrapassa isso. Essa secularização que cheira à empresa é muito nociva para a Igreja e vai de encontro com a Palavra. Na década de 60 a igreja ficava aberta o dia todo, o padre disponível. Isso, por exemplo, foi uma grande perda. Fico arrepiado quando vejo pela TV que o altar se transformou num palco, onde a figura central não é o sacramento, mas os atores que ali estão e que parecem desempenhar um papel todo coreografado.
  • O que você acha dos reencontros com os ex-colegas do ex-SIC?
Infelizmente não pude participar ainda, apesar dos convites. É boa a iniciativa de rever velhos companheiros. Faz bem para a saúde mental. Posso garantir isso!
  • Alguma sugestão?
Nenhuma.
  • Qual pergunta você gostaria de ter respondido e que não foi feita?
Nenhuma. E desculpe-me se fui excessivo. Aprendi a escrever e ter gosto pela escrita no Seminário.
  • Há algum outro endereço na internet que tenha mais informações sobre você? Algum "link" que você queira divulgar?
Se algum colega quiser ter acesso a textos sobre a questão das drogas, basta digitar josé antonio zago álcool drogas no google (e clicar), pois alguns deles estão disponíveis na Internet. Quem sabe algum colega deseja abraçar essa causa também!
  • Alguma mensagem especial aos outros ex-SIC?
Meus cumprimentos pelos que tiveram a iniciativa de proporcionar esses re-encontros e essas buscas, no sentido de reunir nossos irmãos dispersos. Ficamos contentes com a maioria das notícias, sabendo que essas pessoas especiais estão de bem com a vida. Às vezes ficamos surpresos e tristes com alguma notícia, por exemplo, o falecimento do Véio. Era um grande contador de histórias e todos da classe o admirávamos por essa e muitas outras qualidades que possuía.
Peço permissão para reproduzir uma parte da passagem de Terra dos Homens (1939) de Exupéry:
“A vida nos separa dos companheiros e nos impede de pensar muito nisso. Eles estão em algum lugar, não se sabe bem onde (…).
Mas pouco a pouco descobrimos que não ouviremos nunca mais o riso claro daquele companheiro; descobrimos que aquele jardim está fechado para sempre. Então começa o nosso verdadeiro luto, que não é desesperado, mas um pouco amargo. Nada, jamais, na verdade, substituirá o companheiro perdido. Ninguém pode criar velhos companheiros. Nada vale o tesouro de tantas recordações comuns, de tantas horas más vividas juntos, de tantas reconciliações, de tantos impulsos afetivos. Não se reconstroem essas amizades. Seria inútil plantar um carvalho na esperança de ter, em breve, o abrigo de suas folhas.”

José Antonio Zago


"É boa a iniciativa de rever velhos companheiros. Faz bem para a saúde mental. Posso garantir isso!"

Ele tem autoridade de sobra para garantir isso.

Comentar as entrevistas dos "velhos companheiros" também. Pode não fazer tão bem quanto revê-los, mas que ajuda, ajuda. Isso eu, sem autoridade alguma, garanto...rsrsrs. Só não esqueça de identificar-se caso comente como anônimo.

Já estão se esgotando as entrevistas a serem publicadas. Se ainda não atendeu nosso convite para participar como entrevistado, faço-o o quanto antes. Todas as respostas recebidas até 15/dez/2010 já foram publicadas. Se você respondeu antes desta data e ainda não foi publicado, avise-me, por favor.

Até a próxima semana

J. Reinaldo Rocha(62-67)

sábado, 8 de janeiro de 2011

"Depois que saí do seminário andei buscando uma série de respostas para alguns problemas mal resolvidos – e foi lá que ficaram as respostas – tenho certeza"




Hoje retomamos as publicações desta série de entrevistas apresentando mais um agregado (vindo de outra diocese). Se eu escrever que foi trazido pelo irmão Lima garanto que muitos já saberão de quem se trata.

Mas, antes de revelar sua identidade, sugiro que leiam com atenção a trajetória deste nosso colega e percebam os mesmos turbilhões de auto-questionamentos e dúvidas dos quais muitos de nós fomos acometidos em algumas fases de nossas vidas. 


  • Quando entrou para o ex-SIC?

No ex-SIC entrei em 1969 levado pelo então irmão Lima, que depois se ordenou sacerdote. Ele era irmão coadjutor aqui no Rio de Janeiro, no seminário jesuíta chamado “Aluisianum” onde estudei do Admissão à quarta série ginasial (1961 a 1965).
  • De que cidade/paróquia?
Nasci no Rio de Janeiro, no bairro da Tijuca (morro da Formiga) em 28/06/1948 e na minha infância fui coroinha na Paróquia de São Cosme e São Damião, já no bairro do Andaraí, no morro do mesmo nome, onde morei por 5 anos antes de ir para o seminário dos jesuítas.
  • Por que entrou para o seminário?
O meu irmão mais velho, Sebastião, hoje já falecido, trabalhava como menor na gráfica da Revista Mensageiro do Coração de Jesus, onde o irmão Lima era diretor. O irmão Lima decidiu ajudá-lo levando-o para o seminário para que pudesse estudar. Um dia, indo em minha casa, me conheceu e também resolveu me levar para o tal seminário. Meu irmão saiu no ano seguinte e eu continuei até a quarta série. O irmão Lima costumava dizer que eu o convenci depois de um “olhar para ele” com tanta penetração que ele viu em minha alma, com apenas 11 anos, que eu tinha algo de “angelical” e “formosura” que devia ser melhor lapidado.
  • Quantos anos tinha quando entrou?
Nos jesuítas entrei com 12 anos e no ex-SIC já estava com 20 anos.
Depois que saí dos jesuítas fiz os dois primeiros anos do Colegial e servi o exército na Brigada Aeroterrestre (com 17 anos porque esta tropa aceita voluntários com esta idade). Fui paraquedista militar e civil por 2 anos e 11 meses saindo como Cabo – para ir para Campinas a convite do irmão Lima. Eu aceitei porque alguma coisa me dizia que precisava estudar melhor a minha vocação – mesmo sem a aprovação de minha mãe: ela achava que eu estava desperdiçando oportunidades de ouro naquele momento da minha vida.
  • Quando saiu do ex-SIC?
Eu fiz o 3o Clássico em 1969 e dois anos de Ciências Sociais na PUCC saindo em 1971, mas ainda fiquei um ano na cidade morando com alguns seminaristas que saíram na mesma época: José Roberto, Luiz Aparecido Bertazi, o ex-padre Jorge (Onça) em um breve período e mais três amigos (leigos). Depois consegui transferência para a Universidade Federal Fluminense (UFF) onde terminei os estudos.
  • Por que saiu do seminário?
Depois de um pequeno período no seminário Imaculada eu percebi que realmente não era a minha vocação. As apelações do mundo exterior falaram mais alto. Eu estava também um pouco decepcionado comigo mesmo, com alguns amigos, com alguns religiosos – e esse somatório de decepções e apelações foram mais fortes...
  • O que aprendeu no ex-SIC? ou faltou aprender?
No ex-SIC só aprendi coisas boas. Conheci a simplicidade em alguns, a humildade em outros, a força de vontade, a religiosidade da maioria, o carinho com que todos me tratavam – acho também por eu ser carioca: senti que todos gostavam de mim, do modo de falar, dos meus valores, da minha experiência de vida, enfim, fui muito feliz ao lado dos que estavam ali naquele momento da minha vida.
Nós nunca aprendemos tudo! Mas para o período que vivi no SIC aprendi o que tinha que aprender mesmo: me tornei mais altruísta, mais generoso, a viver em grupo, partilhar, respeitar as diversidades, passar adiante nossos conhecimentos religiosos, atuando num grupo de jovens pobres da periferia (JUBA – Juventude Unida Baseada no Amor). Profissionalmente trabalhei na Cáritas Arquidiocesana (dentro do SIC) onde aprendi muito – inclusive tive a oportunidade de fazer um curso de Secretário Executivo para atuar melhor com as obras sociais filiadas.
  • O que fez depois que saiu?
Continuei na PUCC até o fim do ano, morando numa república (que já mencionei acima), trabalhando como inspetor de alunos no Pio XII. Pedi transferência para o Rio e fui terminar meu curso de Ciências Sociais na UFF (Federal Fluminense) onde me formei em 1976.
  • Qual sua trajetória profissional após a saída do ex-SIC?
No Rio de Janeiro, depois que tirei uma “autorização provisória para lecionar”, dei aulas de Geografia e História em vários colégios particulares. Consegui dar aulas por 20 anos no mesmo colégio em que fiz o seminário jesuíta – Colégio Santo Inácio (de 1973 a 1993). Em 1993 entrei para o colégio Salesiano (na mesma rua onde moro até hoje) e me aposentei em 2002. Mas, em 1988 fiz concurso para o magistério municipal: como em 1990 tive um enfarte fui afastado de sala de aula e me mandaram trabalhar na secretaria de uma escola pública próximo à minha residência, onde estou até hoje.
  • Casou? Tem filhos? Netos?
Acho que fui um pouco apressado! Me casei em 1973 com Marly Jorge Verly de Oliveira. Tive 3 filhos (Flavia, Sergio e Marcelo – todos bem encaminhados na vida) e 7 netos: o mais velho já tem 12 anos. A Marly eu já namorava antes de entrar no SIC, inclusive me visitou (apenas visitou) por duas vezes em Campinas, acompanhada de minha mãe. Infelizmente descobri que o casamento também não era a minha vocação. Me separei em 1983 mas até hoje mantenho uma relação bastante amistosa com minha ex e meus filhos e netos – “graças a Deus”! Vivi uns dois meses numa pensão e, depois que conheci um amigo que morava sozinho e precisava de alguém para ajudar a dividir as despesas, fui morar com ele e estamos dividindo o mesmo espaço há 29 anos. Foi padre Lazarista, um amigo verdadeiro, hoje com 89 anos, com Alzheimer, precisando mais do que nunca da minha presença.
  • Quais as recordações mais marcantes do tempo de ex-SIC? 
São tantas as lembranças! Muitas coisas vão se perdendo com o passar do tempo. Lembro-me bem, por exemplo, de um passeio a Itanhaém onde ficamos quase o dia todo em Mayrinck para fazer baldeação. Lembro desta passagem porque no Seminário eu vivia muito separado do grupo (morava na ala dos padres) e num passeio a socialização sempre é muito intensa; o contato cara-a-cara é prazeroso e aproxima mais as pessoas. Lembro-me também de uma noite que convidei alguns “ditos menores” para irmos ao cinema pois eu tinha as chaves da portaria. Na volta o monsenhor Bruno estava nos esperando, me passou tremendo pito e me tomou as chaves. Outra coisa que lembro foi o incentivo que o Daólio me deu para treinar no seu fusca (verde) e depois tirar a carteira de motorista – isso me valeu muito. Não sei se o Daólio reparou mas até hoje gosto muito dele.
Mas guardo comigo algumas passagens que me decepcionaram muito – que prefiro não mencioná-las - talvez tenham ajudado na minha decisão sobre continuar ou não estudando minha vocação.
  • Cite um personagem com que conviveu na época que o impressionou positiva ou negativamente.
Positivamente quase todos, mas sempre tem aqueles que conviveram mais de perto ou que por algum motivo mereceram ficar guardados no coração: o José Roberto Andrade dos Santos e o Pedro Boldorini (Pedrão) foram mais que irmãos para mim; o Luiz Aparecido Bertazi (na república) passou comigo momentos tão difíceis – e conseguimos superar um por um com coragem; não posso deixar de mencionar aqueles que se identificaram mais comigo como o Grego, Talpo, Alcides Cantelli, Carani, Pitoli, Pilon, Bressan, Sibinelli, Fadel, Zóquio. Guardo de cada um passagens que por algum motivo me marcaram.
  • Se voltasse no tempo iria novamente para o ex-SIC? Por que?
Acho que sim. Depois que saí do seminário andei buscando uma série de respostas para alguns problemas mal resolvidos – e foi lá que ficaram as respostas – tenho certeza.
  • Quais as principais mudanças que a entrada (e/ou saída) do seminário provocou em você?
Quando entrei no SIC já tinha 20 anos. O seminário serviu para corrigir alguns rumos que a minha vida tinha tomado depois que deixei o seminário jesuíta com 16 anos. Mas, como a formação jesuíta incutiu em mim muita disciplina, obediência e transparência, foi fácil conviver novamente numa comunidade religiosa.
  • Se dedica à Igreja  Católica atualmente? Qual sua relação com a religião atualmente?
Ainda me dedico. Tenho participado normalmente das atividades de minha paróquia onde sou Secretário da Congregação Mariana e comentarista na missa das 7h aos domingos. Não vejo nada de mal nisso, apesar de ter me tornado um cara muito cético; discordo de vários dogmas da Igreja. Mas isso fica entre mim e Deus!
  • O que você acha dos reencontros com os ex-colegas do ex-SIC?
Super importante. Não é apenas uma volta ao passado. É reviver um período que foi importante em nossa vida. É rever aquela pessoa que um dia representou tanto na nossa formação. É pena que só pude participar de dois encontros. Ainda mais agora com o problema do meu amigo João que não pode ficar sozinho um dia inteiro, ficou mais difícil.
  • Há algum outro endereço na internet que tenha mais informações sobre você?
Já participei do Orkut e do facebook, mas atualmente “tô fora”.
  • Alguma mensagem especial aos outros ex-SIC?
Primeiramente quero externar minha gratidão pelo acolhimento que me dispensaram nas duas oportunidades que participei – tanto os que já conhecia e os que passei a conhecer naquele momento. Quero também agradecer a continuidade nas comunicações pós encontro com o Grego, o Rocha, o Aluizio, o Daólio e o Durval que, sem me conhecer pessoalmente, descobrimos termos muitas coisas em comum.

Sergio Verly de Oliveira

Fico muito contente em perceber que todos os agregados que passaram pelo ex-SIC e que nos contaram suas histórias até o momento, tenham sempre relatado o quanto foram bem recebidos e acolhidos. Isso em diferentes épocas e diferentes circunstâncias.

Gostaria de ler os relatos dos demais agregados que por lá passaram para saber se esse tratamento foi uma constante ou houve exceções. Estamos aguardando suas participações como entrevistados! 

Eu enviei um convite para participar a todos os que estão com e-mail ativos em nossa lista de contatos. Portanto, se alguém não recebeu o convite para participar, comunique-se através do e-mail: ex.sic.1955@gmail.com


Enquanto elas não chegam, vamos comentar esta e as demais entrevistas já publicadas. Mais uma vez lembrando: se comentar como anônimo, identifique-se, por favor.


Semana que vem haverá mais.


Até lá.


J. Reinaldo Rocha(62-67)