sábado, 11 de dezembro de 2010

"Aprendi muito no seminário, mas faltou mesmo aprender a ser padre"

Qual adolescente nunca começou a escrever um diário? O meu não demorou mais que 2 semanas, quiçá 2 dias. Felizmente o nosso entrevistado de hoje foi persistente e escreveu durante muito tempo de sua adolescência e juventude.
Sorte nossa. Pela primeira vez nesta série de entrevistas leremos relatos sobre fatos, sem o filtro da memória. São citações do seu diário.
Ficou curioso para saber como eram as anotações de alguém que conviveu no ambiente do ex-SIC? Garanto que a leitura das respostas o deixará com a sensação de "quero mais!".
Então acompanhem a trajetória super ativa e multifacetada deste nosso colega.

  • Quando entrou para o ex-SIC?
Em 1959,  mas como não passei no exame de admissão (lembram-se dele?)  tive que frequentar a turma do admissão, por isto fiquei na turma de 1960.
  • De que cidade/paróquia?
De Americana-SP, da paróquia de Santo Antonio.
  • Por que entrou para o seminário?
Família católica e pobre, era um menino ativo, moleque bom de bola, de pião, de fubeca (bola de gude), de soltar papagaio (pipa), que estudava em escola pública. Fui coroinha, me ligando muito  ao vigário da paróquia de Santo Antonio, Mons. Nazareno Maggi, homem culto, idealizador e empreendedor (planejou e construiu a igreja matriz de Americana (como réplica da basílica de S.Pedro), repleta de pinturas artísticas by Gentilli (pintor italiano), que emocionam tantos quantos a frequentam e visitam. Sabia “tudo” das cerimônias religiosas, respostas em latim, tocar os sinos para qualquer cerimônia (missa normal, missa de 7° dia, falecimento de adulto, de criança etc) e tinha “trânsito”  em todas as atividades da paróquia. Por que não ser padre também? Seria natural não?  E fui levado ao seminário de Campinas, ainda de calça curta, pelo meu vigário.
  • Quantos anos tinha quando entrou?
12 anos completos, pois sou de janeiro.
  • Quando saiu do ex-SIC?
Em junho de 1965, na segunda série do colegial.
  • Quantos anos tinha quando saiu?
18 anos e 6 meses.
  • Por que saiu do seminário? 
Fui avaliado, como todos eram, e diante do atos de inquietude, rebeldia, e desobediência de algumas normas vigentes, me foi dito que eu deveria viver “lá fora” um tempo e pensar sobre o que pretendia fazer da vida. Após esta decisão, anotei em meu diário dia 22/6/1965 (escrevi 19 cadernos (aqueles do MEC (lembram-se?), cerca de 2.200 páginas, no período de dezembro 1961 a dezembro 1966, os quais guardo comigo até hoje): “Padre Vanim chamou-me ao quarto dele. Disse que formou sua opinião e que eu não dou para continuar no Seminário. Que não posso ser padre. Aconselhou-me que saísse para meu próprio bem. Anotado no seu fichário estavam escritos meus defeitos: independente, auto-suficiente, mais ou menos revoltado, ciclotímico (altos e baixos emocionais), misterioso e fechado, desajustado na recreação e na classe, falta às aulas e saídas da comunidade sem justificativas, parece não confiar na ação e orientação dos superiores, não vibra, egoísta, tem certo “misticismo”. Saí da sala nem triste nem alegre. Dia 26/6 – Durante a missa, o chefe (mons. Bruno) chamou-me. Iniciou dizendo que a opinião dos padres é que devo deixar o seminário. Levei um “pequeno” choque. Claro, por esta não esperava. Disse para eu aproveitar este tempo para “fortalecer” a vocação, para ver se desejava seguir o Cristo ou não. Disse-me que não comunicasse a minha saída para ninguém, mas não me contive. Tinha que me despedir dos amigos. Contei a cada amigo. Não queriam acreditar. Choque geral. Tristeza amical. Olhos anuviados. Corações amargos. Fiquei as últimas horas com os amigos. …. Saberei ser o Chico de sempre. O Chico cristão, o Chico amigo, o Chico Paulo. Há muito que pensar. O melhor é dormir.”
  • O que aprendeu no ex-SIC?
De meus pais trouxe a ética, a moral e a honestidade e do SIC aprendi a cultura, a educação social, a observação das normas, dos ritos, das metodologias canônicas. Enfim, como nossa formação partia de uma “ tabula rasa”, podíamos acreditar que tudo ali era para que o reino dos céus fosse alcançado.  Aprendi  a ser líder, a ter gosto pelos estudos, pela leitura (Li todos os volumes da coleção História Universal de Cesare Cantu, Julio Verne, Machado de Assis, Michel Quoist, etc.), pelas artes (teatro, rádio, música,cinema), pelo esporte (procurava praticar todos de campo e de mesa), pela convivência em grupo, pelo silêncio coletivo, pelo trabalho social (na comunidade do Paieiro), pela ajuda aos colegas exercitada quando treinava as equipes de médios e de menores, pela importância da carestia que tínhamos e nos levava a aproveitar tudo, a reciclar e  recuperar o que fosse possível. Lembram-se dos consertos de bolinhas de ping-pong, dos consertos das câmeras de ar das bolas furadas, das encadernações, dos livros das turmas anteriores, onde constavam, inclusive, as piadas que seriam contadas todos os anos, naquela página, pelo cônego Luiz? Aprendi a ser um exímio datilógrafo, que me colocou nas áreas administrativas do Exército, quando fui incorporado, além de me permitir, até hoje, digitar com os dez dedos, sem olhar o teclado. Enfim, recebíamos uma formação acima da média, pois ao ingressar novamente  nas escolas públicas, éramos uns dos melhores em Português, Línguas (fiz meu vestibular para Ciências Sociais em Francês), História, Ciências. Aprendi matemática para a vida (como dizia o inesquecível Padre Sena, mais inesquecível ainda quando descobri que era são-paulino), a fazer contas de cabeça (não tínhamos calculadoras). O desenvolvimento da oratória, através da desinibição para enfrentar as leituras em público, as poesias, críticas e discursos na Academia São Luis de Aquino, importantíssima na minha vida profissional, como palestrante e instrutor de cursos in company.
  • O que faltou aprender?
A educação foi tudo para minha vida e, com certeza, na vida de todos. Aprendi muito no seminário, mas faltou mesmo aprender a ser padre, pois o objetivo do seminário era preparar os jovens para se tornarem padres, mas a eficácia das técnicas não funcionaram bem, pois o número de seminaristas encaminhados ao seminário maior x número de internos era muito pouca e menos ainda se computarmos as desistências no seminário maior e também pós ordenações. Aprendemos que muitos eram chamados e poucos escolhidos, mas com certeza algumas vocações foram prematuramente descartadas.
  • O que fez depois que saiu? Estudou o que?
De volta ao mundo secular, nenhuma bússola tínhamos tanto no campo profissional como educacional. Mas a formação escolar (com forte tendência para as letras e educação) nos levava para o setor de humanas. Saí no meio do 2ª série do Clássico e me matriculei em Americana, onde conclui (sem precisar estudar devido à grande base que tínhamos (imaginem Português, Francês, Latim (tinha latim ainda), História etc.). Como havia me alistado no exército (enquanto seminarista ainda), tive que me incorporar e fui servir na Escola de Cadetes de Campinas e conclui o 3° Clássico, no colégio Vitor Meirelles em Campinas. Ali ganhei um prêmio (1° lugar) de História (uma medalha do Exército) em um concurso para as escolas públicas, quando escrevi sobre a vida de Duque de Caxias, o que me promoveu na escola e no Exército, onde servia, já como Cabo de carreira. Acho que merece explicação porque fui fazer o exército. Eu queria fazer faculdade na PUC Campinas para me dedicar ao magistério. Origem pobre (lembram-se?), família não poderia me sustentar novamente, então optei por seguir carreira no Exército de janeiro 1966 a agosto de 1968 (afinal de seminarista a soldado o modus vivendi não mudava muito: disciplina, obediência, ordem, hierarquia, superiores etc. Embora as diferenças eram de orientação, de objetivo final. De seminarista a soldado. Que ironia! Mudava o foco, a meta, mas o objetivo meu era ter onde morar (no quartel, onde eramos denominados de “laranjeira” ), fiz curso para Cabo para ganhar mais e diminuir os plantões e poder ter mais tempo para estudar mais (foram recrutas meus Wisiack, Berthier e o Sturaro (Veio). Que ironia do destino!). Com isto consegui pagar o curso de Ciências Sociais (PUCCampinas), de 1967 a 1970. Nesta época, os ex-colegas já estavam na casa do Bosque e estudando Filosofia durante o dia. Já em São Paulo, quando atuava como supervisor da área de Desenvolvimento e Treinamento, na Villares, tive a oportunidade de fazer a Faculdade de Administração de Empresas (de 1978 a 1981), para poder legalizar minha carreira com registro no CRA. Em Minas Gerais, fui dirigir a área de Recursos Humanos da Mangels e senti necessidade de dominar melhor a área jurídica e cursei a Faculdade de Direito (1985 a 1988), me tornando advogado com OAB-SC n° 17511-B.
  • Qual sua trajetória profissional após a saída do ex-SIC?
Fui levado para a General Electric-Campinas, pelo professor de Antropologia Desiderio Aitai (que trabalhava na GE), para atuar como Analista de Treinamento. Fui para a Suzano, em São Paulo, para compor a equipe de Treinamento e fundar o Jornal Interno do Grupo. Fui contratado pela Villares para atuar em treinamento operacional e administrativo (para onde levei o Gabriel (Bié) para trabalhar na minha equipe. Fui para a Mangels como Desenvolvimento de Executivos onde tive a oportunidade de trabalhar em São Bernardo, São Paulo e Três Corações-MG, (onde continuei jogando futebol, sendo diversas vezes campeão nos Campeonatos da cidade, onde recebi de presente a camisa 7 do Greminas como recordação da “aposentadoria” dos campos de futebol.). Fui para a Gradiente de Manaus, onde atuei como Gerente de Recursos Humanos e Administração, por 2 anos. Fui contratado pela TIM para coordenar as atividades administrativas, logística e de recursos humanos na Bahia e Sergipe (sede em Salvador), Minas Gerais (sede em BH) e finalmente Estado de São Paulo, (sede em São Paulo), para a implantação da telefonia celular no Brasil pós-privatização, onde permaneci até 2002 e encerrei minhas atividades na carreira de Administrador em Recursos Humanos e Gestão Estratégica de negócios. Enfim, uma vida dedicada à formação de trabalhadores, de executivos, de orientação profissional e pessoal, alicerçada na formação recebida no processo educacional e religioso e respeito pelo ser humano nos 6,5 anos de seminário.
  • Trabalha ainda?
Felizmente ainda me encontro em plena atividade mental e física para continuar trabalhando na área administrativo-financeira e recursos humanos na Neoprene do Brasil, empresa de produção e distribuição de neoprene (www.neoprene.com.br),em Garopaba-SC, e sócio da empresa BN, proprietária da marca Truzz (www.truzz.com.br), após passar por uma experiência como empresário de fabricação de bolsas e mochilas, de 2002 a 2006. Como dizem os sulistas: “tu és um guri ainda!”.
  • Casou? Tem filhos? Netos?
Minha esposa Janete agradeceu pessoalmente o Pe. Vanim no encontro de Indaiatuba, por ter me dispensado do seminário e poder casar comigo em 1968. Temos os filhos Marcelo (40) e Ricardo (36) e 3 netos (Tais, Yasmin e Fabrizio). Fato interessante é que a Janete (residia na rua de baixo da minha) era filha de evangélicos e eu filho de católicos e ex-seminarista. Como casar, sendo os noivos de religiões diferentes? Com todos os estigmas e preconceitos da época! Minha família não entraria na igreja evangélica e a família da minha noiva não entraria na igreja católica. A solução foi casar em casa e para isto tive que pedir permissão ao Bispo de Campinas. Recorri ao padre Arlindo De Nadai para oficializar o matrimônio católico, juntamente com um pastor evangélico. Ninguém acreditava no que estava acontecendo, pois deve ter sido o primeiro casamento entre um católico e uma evangélica. E notem, que nesta época ainda sob efeito das mudanças do Concílio Vaticano II, e eu vinha atuando muito intensamente como comentarista nos “novos” ritos religiosos. O casamento foi por puro amor, pois tivemos que vencer muitas adversidades conceituais-religiosas e estamos juntos há 42 anos, comemorando a cada ano, mais um ano de vida juntos e em harmonia. O respeito um pelo outro esteve acima de tudo e nunca nos preocupamos em tentar convencer um ao outro qual religião é melhor.
  • Quais as recordações mais marcantes do tempo de ex-SIC? 
Foram 6,5 anos passados intra-muros, pois éramos internos, sem convivência familiar, (apenas nas férias), vivendo entre colegas, na busca de um ideal comum, estudando, rezando e se divertindo. No estudo, a necessidade de utilizar todo tempo disponível para aprender, ler e estudar, embora focado mais nas atividades humanas que nas ciências exatas, apesar do esforço do Pe. Sena. Marcaram-me muito as atividades da Academia Literária São Tomás de Aquino, onde nos exercitávamos na oratória, na declamação, nas críticas literárias. Ganhei um livro de honra ao mérito pelo melhor trabalho da classe, em 4/12/1964, assinado por Mons. Abreu e Fernando Benini. Que troféu! A base foi tão forte que na vida profissional fui muito valorizado pela capacidade de falar em público, pelas palestras e treinamento de executivos. A criatividade aprendida no teatro, bastante improvisado, mas sempre alegrando e divertindo as platéias. Aprendi a dar valor ao silêncio para fazer as refeições, (lembram-se como se pedia arroz, feijão, água etc?), para meditar, para ler, para ouvir a leitura nas refeições, para conversar com os colegas. Uma vez por mês, era de visita e eu esperava minha mãe trazendo notícias da família e algo diferente para comer. Na vida religiosa, todo ritual litúrgico que parecia ad eternum, mas totalmente alterado pelo Concílio Vaticano II, banalizando seculares orientações católicas. As orientações dos conselheiros espirituais serviam para nos delimitar nas ações em comunidade, na convivência com os colegas. Na vida social e esportiva, todos nós queríamos participar e fazer o melhor, pois eram onde se poderia extravasar, onde se poderia demonstrar as habilidades inerentes a cada um, quer na música, no teatro, na coordenação de atividades, nos esportes, especialmente no futebol, que sempre unia todos. Até hoje faço as séries dos exercícios de ginástica que fazíamos. Participar das seleções de futebol era o sonho de cada um e o Chico Fumaça marcou sua história. Uma passagem transcrita de meu diário: “1/4/1962 – Domingo – No recreio do almoço o pe. Vanim deu-nos uma instrução sobre o modo de jogar. Às 15,40 começou o jogo: Seminário x Itapira. Não comecei a jogar. Mas o Pe. Hugo machucou-se e eu entrei logo no começo. Acabou o 1° tempo. Estávamos perdendo de 1 x 0. Começou o 2°. O Vicentim foi de centro-avante e o Bacarim entrou. Perdíamos de 2 x 0. Logo depois 2 x 2. Jogo duro. A torcida animou e eu com um chute de esquerdo no sem pulo marquei o gol do desempate. Foi minha estréia na Seleção (do Seminário, com 15 anos) e comecei com um gol. Vencemos por 5 x 2. À noite houve a última prática do Retiro. Dormi. Assim acabou um dia de glória para mim.“ Outra passagem anotada no diário: “29/11/1964 – Domingo – O Seminário jogou e venceu um time de Limeira por 6 x 2. Marquei um gol e gozei dos meus marcadores. Dribles, corridas, levadas tudo fez parte da minha fúria contra o (marcador) que me machucou. A torcida gostava e sorria e apupava. Fecharam-me e pediram para parar senão iam me bater. Nem dei bola. Continuei. Acabado o jogo os colegas vieram gozando e fazendo pilhérias pelos meus dribles e gozações. E eu gostava disto tudo.”
  • Cite um personagem com quem conviveu na época e que o impressionou positiva ou negativamente.
Positivamente meus inesquecíveis colegas de classe como Bié, Bolinha, Boi, Raul, Venturoli, Felício e outros como Benini, Wiziack, Nivaldo Amstalden, Lota (do bairro Paieirão). Dos superiores Mons. Bruno Nardini (disciplinador), Conego Luis (pela esportividade) e Mons. Luiz de Abreu (pelo idealismo e cultura). Aprendi a rir com nossas encenações teatrais, especialmente as criadas pelo Benini e lembro-me uma do Raul que ficou famosa: quando a peça se encerrou e as cortinas se fecharam rapidamente o Raul ficou do “ lado de fora “ da cortina e sem saber o que fazer virou-se de costas para a platéia que já batia palmas e lascou esta: “ai minha bunda!” e correu para dentro do palco. Pelo inusitado, as gargalhadas foram retumbantes.
  • Sobrou alguma mágoa? Qual?
Estávamos num turbilhão de mudanças sociais (Concílio, Jovem Guarda, Guerra Fria União Soviética-Estados Unidos, Revolução Militar 64 ) e não fomos preparados para nada disto que estava ocorrendo extra-muros (ah! Sim aprendemos muito sobre a Revolução de 1932) e cada um teve que viver sua própria experiência. Seria diferente? Estive entre a cruz (ex-colegas do ex-sic estudando filosofia ) e o fuzil (militar orientado para enfrentar os distúrbios dos estudantes). Que conflito!!!
  • Se voltasse no tempo iria novamente para o ex-SIC? Por que?
A experiência de vida é impar, imutável e de reflexos perenes na vida pessoal, social e profissional. E colocada no tempo em que se viveu. Por isto, se voltasse no tempo, certamente, voltaria para o seminário e viveria as mesmas experiências. Ah, se pudesse ter mudado alguma coisa, mudaria sim a forma de seleção das competências pessoais e as orientaria para a vida e não apenas se serviria ou não para ser padre. A frustração de ser desligado do sistema foi muito traumática, afinal ser padre não seria uma profissão, mas um representante da Igreja, inserido dentro de uma rígida hierarquia.
  • Quais as principais mudanças que a entrada (e/ou saída) do seminário provocou em você?
O ingresso no seminário me tornou uma pessoa bem preparada culturalmente, um líder, um estudioso, um humanista. A saída me colocou no mundo de forma despreparada, sem entender que caminho se poderia seguir, se tudo que se praticava era verdade ou apenas ritual decorado, especialmente depois que alguns que nos orientavam deixaram de pertencer a este seleto grupo.
  • Dedica-se à Igreja Católica atualmente?
Por alguns anos me dediquei às cerimônias litúrgicas, imaginando que poderia auxiliar os fiéis a entender as mudanças provocadas pelo Concílio, poderia ser útil para a minha paróquia. Mas, não tinha mais o estigma do “seminarista” e tudo foi esmorecendo. Após meu casamento, mudei para Campinas e esperei ser “convocado” para participar da nova paróquia, mas pura ilusão. Ninguém tomou conhecimento de minha chegada e me senti solto. Pela orientação bíblica, o pastor tinha que procurar as ovelhas e não a ovelha procurar o rebanho.
  • Qual sua relação com a religião atualmente?
Mantenho minha religiosidade, mas nenhuma dedicação específica. Lembrem que estou casado com uma evangélica, e que nos amamos muito. A religiosidade está inerente em nossas vidas, mas a vida litúrgica, sistemática, aquela de obrigação de missa semanal, confissão periódica, etc, não tenho mais. Rezo todos os dias, tenho minhas dúvidas teológicas, e me sinto bem espiritualmente. Acredito que as orientações da Igreja que recebíamos focavam mais o controle social das sociedades, a educação para viver em comunidade de forma harmoniosa, do que para buscar efetivamente o reino de Deus. E depois, com os avanços que fizemos nos estudos, com o aumento das informações das diferentes culturas, inclusive as orientais, com suas religiões diversas, com as evoluções científicas, muita confusão se instala em nossas mentes e nos faz pensar o que é certo ou errado.
  • Como você compara a sua religiosidade daquela época com a atual?
Estudei Sociologia e Antropologia e identifiquei bem as funções da sociedade e os papéis que são desempenhados na vida. Naquela época, vivemos um papel bem definido pela Igreja, onde tudo nos levava a exercer os atos litúrgicos de forma repetitiva, mecânica e quem sabe desinteressada. Tínhamos tudo programado, dia após dia, ano após ano. E nos remetiam sempre a ter fé, a acreditar no divino, no espiritual. Minha religiosidade estava bem centrada nas oportunidades que tinha em ser um personagem atuante na liturgia, como coroinha, como seminarista, como membro da comunidade religiosa. E ser padre, seria mais um papel que poderia perfeitamente desempenhar na sociedade? Depois, descobri que podemos desempenhar diferentes outros papéis sem deixar de manter a religiosidade inerente ao ser humano. É assim que encarei minha vida pós seminário: em cada papel que eu assumisse fazia o melhor de mim, respeitando o próximo como Ele nos ensinou, as leis vigentes para viver em paz com a sociedade e apoiando-me na espiritualidade impregnada em meu interior.
  • Como você compara a Igreja Católica daquela época com a atual?
Da atual, estou um pouco desligado e não tenho acompanhado suas evoluções e mudanças. Dá para relembrar das influências de pessoas carismáticas, de quando tive a oportunidade de ir receber o papa João Paulo II na av. 23 de maio, quando de sua primeira vinda ao Brasil, onde milhares de pessoas se acotovelavam para vê-lo e de ir a Roma na praça de S. Pedro lotada, onde estive na primeira fila e poder pegar em sua mão. Que emoção! Que carisma! Tive oportunidade de ler os sermões rascunhados pelo Mons. Nazareno Maggi, meu vigário, que se preparava para cada missa dominical e estudava o que desejava dizer aos fiéis. Que carisma! Hoje, quando assisto uma missa e ouço os sermões, percebo as dificuldades retóricas e de oratória dos oficiantes, as dificuldades para motivar os fiéis. Até porque, está tudo padronizado pelos folhetos nacionalmente impressos. Perdeu-se o Carisma inerente à função sacerdotal. Então, prefiro ficar com a Biblia, a qual leio periodicamente e rezo diariamente. Até porque, a oração é um momento de silêncio que me mantem acreditando em algo espiritual.
  • O que você acha dos reencontros com os ex-colegas do ex-SIC?
Quando recebi o telefonema do Grego, me achando em Garopaba-SC, fiquei animadíssimo para rever os colegas de um período fantástico de minha vida. Foi uma enorme lufada nas brasas ainda acesas e ocultas pelas cinzas do tempo. E tudo se reavivou. Nada seria melhor que recontar as histórias antigas e rememorar os fatos que nos marcaram. Mais importante foi saber que existia uma ligação emocional em cada um que ia chegando, se abraçava e se identificava, não importando se os cabelos tinham ficado brancos, quando haviam, ou se o peso tinha duplicado. Outro fato marcante, foi a coleta de fotos da época, organizadas por temas, para nos avivar e é tão gostoso, de vez em quando, ir olhando os rostos de nossos colegas e buscar na memória os fatos que nos ligavam. Depois o blog e agora as entrevistas, que tem revelado pontos interessantes dos colegas. Curto muito todas as notícias e informações dos colegas.
  • Alguma sugestão?
Entoar um Te Deum para os que têm reordenado esta história do ex-sic, especialmente o Greco (que me reacendeu as chamas do passado) e o Rocha.
  • Qual pergunta você gostaria de ter respondido e que não foi feita?
Bem que todos os entrevistados pudessem citar os “papéis” que cada um desempenhou durante sua vida, “os títulos” que revelariam as atividades e os sucessos de cada um. Então começo por mim. Além de minha vida profissional, atuei como diretor da Associação Brasileira de Jornais de Empresa (Aberj), diretor da Associação Paulista e Brasileira de Recursos Humanos, diretor da Federação Paulista e Brasileira de Ciclismo, como redator e divulgador das provas oficiais. Professor contratado pelo SENAI para cursos in company. Autor de artigos no livro Manual de Treinamento e Desenvolvimento, em suas 3 edições, membro do Conselho de Desenvolvimento da cidade de Três Corações, presidente do Clube Atlético de Três Corações, que atuava na 2a. Divisão de Minas Gerais, presidente do Rotary Club de Três Corações e Coordenador da campanha política que elegeu minha esposa Janete como a primeira mulher Vereadora de Três Corações, em 1988.
  • Qual a Seleção do Seminário que mais marcou época?
Goleiros: Sawaia (Delmo e Ambiel), Zagueiros: Butti (Boi), Bié, Pe. Vanim (Onça), Bacarim, Armação: Ferraro (Palmeirinha), Morais (Wiziack), Paulo Cesar Provinciato Atacantes: Menegon (Ébene), Vicentim, Chico Fumaça.
  • Há algum outro endereço na internet que tenha mais informações sobre você? Algum "link" que você queira divulgar? 
No google, procurar por Bonganhi, Paulo Sebastião. Nas empresas onde atuo: do meu filho Marcelo www.neoprene.com.br e do Ricardo www.truzz.com.br
  • Alguma mensagem especial aos outros ex-SIC?
Embora cada um tenha seguido seu próprio caminho, aproveitado as oportunidades profissionais, buscado suas próprias realizações e alcançado seu próprio sucesso pessoal, bom seria, se cada um de nós, especialmente os colegas da própria turma e turmas adjacentes, pudesse estar mais aberto a trocas de experiências, contatos contínuos e maior aproximação, adotando o que se convencionou chamar de networking profissional e pessoal. Agora, depois dos diversos encontros e os dados registrados (nome, emails, endereços, telefones) seria possível maior aproximação, maior abertura e consequentemente maior ajuda mútua, nas diferentes oportunidades e necessidades que possam surgir. Enfim, não apenas reviver nosso passado, mas viver juntos o presente e o futuro. Nós temos um DNA em comum, que nos une e aproxima. Basta manter a chama acesa!
Paulo Sebastião Bonganhi 
(Chico Fumaça)


Valeu Chico Fumaça!

Muito bem feita a conclamação para "estar mais aberto a trocas de experiências, contatos contínuos e maior aproximação, adotando o que se convencionou chamar de networking profissional e pessoal".

Lembro a todos que para ajudar nisso foram criadas algumas facilidades:

1) Uma lista de contatos, que vocês podem ter acesso através do "link' que foi passado algumas vezes por e-mail. Quem não recebeu ou perdeu este "link" e quiser tê-lo novamente, basta escrever para ex.sic.1955@gmail.com.

2) Na rede social "Facebook" foi criado um grupo (Inte(g)ração) para permitir "maior aproximação, maior abertura e consequentemente maior ajuda mútua, nas diferentes oportunidades e necessidades que possam surgir". Por ser um grupo fechado apenas os inscritos podem ter acesso ao que lá é publicado. E somente está sendo concedido acesso aos ex-SIC. Foi enviado e-mail com instruções de como participar do grupo. Se quiser obtê-las novamente, escreva-nos.

Se houver outras ideias, avisem-nos que apoiaremos e/ou divulgaremos.
Não nos deixem sós!...rsrs


Até semana que vem.

J. Reinaldo Rocha (62-67)

8 comentários:

  1. -Alô, é o Chico fumaça?
    -O quê? (imaginei a cabeça dele: será uma piada, mas eu sou...eu fui Chico fumaça!!!!)
    -Quem está falando? (como eu ia explicar "quem" se eu tinha 12 anos e ele 18?)
    -Fui seminarista em Campinas, é o Grego....
    -Ó meu Deus, nunca mais ninguém me chamou por Chico Fumaça....
    E os anos já estão passando porque isso foi por volta de 2007...
    E da maravilhosa Garopaba-SC temos uma das mais completas e emocionantes entrevistas.
    O mais interessante é que esses relatos não são meras curiosidades mas revelam fatos, verdades, histórias de vida, uma época das mais agitadas e quantos pulos tínhamos que dar para encontrar um caminho.
    Resta agora pressionar o Chico para "abrir os arquivos"...rs...desse Diário e nos enviar mais trechos deles para colocarmos no site.
    grego

    ResponderExcluir
  2. Chico, bom dia!
    Belíssimas suas memórias, suas palavras que me remeteram a um passado tão bom de ser revivido.
    Fomos contemporâneos em 1961 e 1962. Você pode não se lembrar, mas ao final de 1961 foi anunciado como titular da seleção de futebol do seminário, para o ano de 1962 pelo então Pe.Vanin. Não tenho lembrança desse golaço que fez contra Itapira, mas com certeza devo ter vibrado muito com ele.
    Quanto à forma sumária pela qual foi dispensado do seminário, traumatizante... dolorosa... e com tantos outros predicados que designam situação de fracasso ou derrota, foram elimintadas com as grandes vitórias que você conquistou em todos os sentidos em sua vida, incluíndo a felicidade de ter encontrado a Dª Janete. Comprovam ainda o célebre ditado de que Deus escreve certo por linhas tortas... e o mundo pode conhecer um cidadão exemplar que soube aplicar em todas as frentes que se lhe apresentaram, todos os conhecimentos que a vida do seminário lhe pode incutir.
    Sinto-me honrado tendo o privilégio de tê-lo como colega.
    Fortíssimo abraço e que continue sendo abençoado com sucesso e felicidade com toda sua família.
    José Fernando Crivellari
    fernando.crivellari@ig.com.br

    ResponderExcluir
  3. Caro Chico Fumaça:
    Boa noite!
    Acabei de ler sua entrevista e gostei bastante dela (linguagem, conteúdo etc).
    Talvez não se lembre de mim, mas vai aqui uma sugestão: Estou participando bastante da vida acadêmica -PUC/SP - Mackenzie etc - com mais foco em EMPREENDEDORISMO - Coordeno Curso de Extensão pela PUC/SP.
    Vou deixar meu e.mail para um contato seu, caso queira trocar idéias sobre sua trajetória profissional que é muito interessante.
    Geraldo Borin - g.borin@terra.com.br

    ResponderExcluir
  4. Borin e Paulo,

    Se as ideias que vocês forem trocar puderem ser compartilhadas com os demais ex-SIC, colocamos nosso grupo Inte(g)ração no Facebook a disposição de vocês.

    Ele foi criado exatamente para isso. É privado. Isto é, apenas os inscritos podem participar. E só há ex-SIC inscritos.

    ResponderExcluir
  5. Parabéns, Bonganhi, sua entrevista foi supimpa! Vc tb é detalhista e isso é bom, porque fustiga nossas mentes que já começam a dar sinais de apagamento, hahahahahah! Legal, pois através dessas entrevistas eu vou redescobrindo as artimanhas(em nome de Deus!)para mandar o seminarista de volta para casa. Essas tais fichas eu as desconhecia. Como será que era a minha, não? Digo isso com um bom senso de humor. Gosto muito do provérbio popular que diz:"Deus escreve certo por linhas tortas". O bonito é poder reconhecer que as linhas não foram tão tortas assim. Por isso é preciso mesmo entoar o "Te Deum", porque a mão de Deus continua nos conduzindo. Vc já parou para pensar no seu sobrenome? Diz muito. Então, Te Deum! rsrsrs...
    Um abraço, amigo!
    Lúcio Inácio da Rosa

    ResponderExcluir
  6. UFA!!! Consegui ler tudo(e tudo no bom sentido).
    Gostei de tudo que voce respondeu.Reforçou mais ainda o quanto é bom reencontrar EX-SIC.
    Tive o prazer de conversar contigo no IX encontro,lá chácara do ESCODRO(inclusive sentamos na mesma mesa para o almoço).
    Voce narrou alguns lances sobre o futebol e também me fez voltar ao passado, quando fiz parte da seleção dos menores.Que tempinho heim?

    abraços,

    DURVAL 63/65

    ResponderExcluir
  7. Como filho de um ex.sic venho atravez deste agradecer profundamente a influencia de todos vcs e tambem do Mons. Bruno Nardini ,Conego Luis e Mons. Luiz de Abreu .Pela disciplina, esportividade e idealismo,que influenciou meu pai e inderetamente a minha pessoa me formando um ser ativo, participante e esportista..
    Me relaciono diretamente com as experiencias de vcs, na qual me influenciou a morar e estudar fora durante a maior parta da minha vida, do qual o "muro" que vcs viveram para mim foi o "muro" do mundo.. sem fronteiras.
    Sempre soube dos "caderninhos" do meu pai que estiveram muito bem guardados e que atravéz desta entrevista relata fazes da vida que sempre soube mais sem muitos detalhes pois como disse os caderninhos estão muito bem guardados.
    Aproveito para agradecer o meu pai "Chico Fumaça" por tudo e todos os conselhos & direcionamentos que fizeram de mim o Homen que hoje sou..
    Finalizo este comentário com uma pergunta para vcs pois a unica duvida em que meu pai nunca explicou diretamente foi o fato do apelido.. Porque Chico Fumaça? Pois como o ditado diz.. filho de peixe, peixinho é! Então filho do Chico Fumaça... fumacinha.. é.
    Grande abraço para todos.
    Saudações.
    Ricardo B.Bonganhi

    ResponderExcluir
  8. Chiquinho Fumacinha...e agora? O apelido do seu pai, fumaça, parece que foi porque ele, quando pegava a bola, desaparecia como fumaça, pela ponta-direita...e o Chico...óh... Bié,Boi,Bolinha,Boing,Patinhas, Pedrão,Pipoca...essa era a turma dele....rs...rs...quem sabe alguem esclareça...
    grego. Vê se rouba esses caderninhos, vai ser um sucesso... pede ajuda prá Janete....rs...rs...

    ResponderExcluir

Seu comentário é importante e bem vindo. Não esqueça de identificar-se.