sábado, 20 de novembro de 2010

"Não aceito totalmente as religiões. A meu ver, instrumentalizam, em seu todo ou em partes, a crença em Deus, visando benefícios próprios."

Mais uma vibrante entrevista de um dos nossos colegas.

É muito interessante conhecer como éramos, como pensávamos e o que a vida fez de nós, como lembrou o Venturoli; ou a vida que fizemos (para contentar a turma da "auto ajuda"..rsrsrs)

E o entrevistado de hoje não se furta a expor como pensava e como pensa hoje após muitos anos e muitas experiências vividas.

Mas, para que vocês o conheçam por inteiro e sintam a importância que ele atribui à convivência com os colegas da comunidade, só lendo as suas respostas.

Ei-las:


  • Quando entrou para o ex-SIC?
Em 1959. Ao chegarmos ao Seminário fizemos exame de admissão. Quem passou, entrou na primeira série do ginásio. Foi o meu caso. Os que não foram aprovados, foram para o Curso de Admissão.
  • De que cidade/paróquia?
Morava em Pirassununga. Paróquia de São Bom Jesus dos Aflitos. O Pároco era o Pe. Janoni. Atualmente o pároco é um ex-professor do Seminário : Mons. Otávio Dorigon (excelente ponta esquerda, na época).
  • Por que entrou para o seminário?
Por vontade própria, embora fosse desejo de minha família, que era muito religiosa. Já era "coroinha", na época do curso primário. Lembro-me que meu avô fazia parte dos "IRMÃOS DO SANTÍSSIMO". Usavam uma vestimenta vermelha - chamada OPA - nas cerimônias. Dois tios já haviam estudado no seminário (Carlos Beltrame de Oliveira, que esteve presente em uma de nossas reuniões, e Antonio Carlos Beltrame de Oliveira, que ficou pouco tempo - na época do Pe. Mateus). Dois primos também tinham entrado para o Seminário: José Roberto de Oliveira, que chegou a estudar no Colégio Pio Brasileiro, em Roma, e seu irmão Domingos Sávio de Oliveira. Assim, a ida para o Seminário foi o caminho natural, tanto para mim como para a família.
  • Quantos anos tinha quando entrou?
Tinha 10 anos e meio.
  • Quando saiu do ex-SIC ?
Saí no final de 1965, ao concluir o 3o. Clássico.
  • Quantos anos tinha quando saiu?
Tinha 17 anos e meio.
  • Por que saiu do seminário?
Comecei a ter dúvidas se realmente eu queria ser padre. Por várias vezes conversei com o Mons. Luiz de Abreu sobre minhas dúvidas, que incluíam inclusive questionamentos sobre fé. Ele já havia me aconselhado a sair há um ano. Foi uma difícil decisão, pois tinha muito medo de causar decepção à família. Lembro-me que, durante as férias, a gente tinha que ajudar o pároco nas diversas cerimônias litúrgicas. Trazíamos um envelope lacrado, que deveria ser entregue ao pároco, para preencher uma ficha de informações sobre nosso comportamento. Ao regressar das férias de final de ano, senti vontade de ler o que o Pe. Germano (Paróquia de Santo Antonio - Pirassununga) havia escrito a meu respeito. Cuidadosamente abri o envelope. Lembro-me perfeitamente de suas (sábias) palavras : "Tenho dúvidas sobre sua vocação. Vamos dar tempo ao tempo." Quem me ajudou muito na tomada da decisão foi o Pe. Nadai. Encorajou-me a ir em frente. Incentivou-me a estudar, por 6 meses, para um concurso do Banco do Brasil. (Prestei o concurso, passei, e acabei trabalhando no Banco por alguns meses). Sou bastante grato a ele por essa inestimável ajuda.
  • O que aprendeu no ex-SIC?
Acho que a maior contribuição dos anos de Seminário foi ensinar-me a resolver os problemas sozinho. Como estudar. Como enfrentar as saudades de casa. Como enquadrar-me nas rígidas normas de disciplina. Como superar os pequenos problemas de relacionamento do dia a dia. É lógico que contava com dezenas de amigos para esse aprendizado. Esse foi o grande segredo do tempo de Seminário: os amigos, verdadeiros irmãos que tínhamos a nosso lado o tempo todo. Quando saí, pude ver como tudo isso foi importante para minha vida.
  • O que faltou aprender?
Acho que faltou uma melhor preparação para a "Saída do Seminário". Nossa formação era toda direcionada para a continuidade. Acho que, diante da perspectiva da saída, deveríamos ter sido preparados para as novas situações que iríamos enfrentar, tanto na vida afetiva, como profissional. Nas turmas posteriores, isso foi bastante amenizado, com o semi-internato. Minha turma talvez tenha sido um divisor de águas nesse aspecto.
  • O que fez depois que saiu? Estudou o que?
Saí em 1965, com 17 anos. Foi difícil arrumar o primeiro emprego, sem ter feito o Serviço Militar. O Banco do Brasil demorou a chamar os concursados aprovados. Trabalhei em Escritório de Contabilidade enquanto fazia um Cursinho para Engenharia em Pirassununga. Prestei o vestibular e entrei na USP (EESC), em Engenharia Civil. Quando estava no primeiro ano, o BB me chamou. Trabalhei alguns meses em São Paulo, mas preferi retornar a São Carlos para continuar a estudar. Fiz Pós Graduação em Solos. Fui trabalhar no DER SP, onde fiquei até 1986. Em 1976, com mais três colegas engenheiros, abrimos uma firma de Geotecnia (SONDOSOLO), com sede em Campinas. Trabalho até hoje nessa firma.
  • Casou? Tem filhos? Netos?
Casei-me em 1979, há 31 anos, com Elsa Marili. Temos dois filhos, Gustavo (25) e André (23), ambos solteiros. Gustavo formou-se em Engenharia de Produção Mecânica na USP. Trabalha atualmente na CTEEP. André está concluindo Engenharia Agrícola na UNICAMP.
  • Quais as recordações mais marcantes do tempo de ex-SIC?
Aqueles sete anos ficaram marcados indelevelmente na memória e no coração. As recordações são várias e ressurgem continuamente a cada dia. Os campeonatos de futebol, os passeios nos finais de semana até a Fonte Sônia, a participação no Coral, as músicas sacras em canto gregoriano, as missas infindáveis, os terços em duplas, no claustro, os retiros espirituais em silêncio, o Martirológio Romano lido diariamente durante as refeições, as disputas de pingue-pongue com o Cônego Luiz, as aulas de Latim e Grego - como não lembrarmos a cada momento de tudo isso?
  • Cite um personagem com quem conviveu na época e que o impressionou positiva ou negativamente.
A convivência com o inesquecível Padre Senna foi de grande importância . Ao lado da formação humanística proporcionada pelo ambiente do Seminário, coube ao Pe. Senna ensinar-nos as Ciências Exatas. E soube fazê-lo com muita sabedoria. Já formado, pude conviver com ele, anos depois, em Campinas. Um exemplo de competência e seriedade.
  • Sobrou alguma mágoa? Qual?
Se houve mágoas, o tempo as apagou. Só restaram boas recordações.
  • Se voltasse no tempo iria novamente para o ex-SIC? Por que?
Se as condições da época fossem as mesmas, acredito que faria tudo do mesmo jeito.
  • Quais as principais mudanças que a entrada (e/ou saída) do seminário provocou em você?
Valorizo muito a base cultural que adquiri naqueles anos.
  • Se dedica à Igreja Católica atualmente?
Tenho algumas restrições à Igreja, como instituição.
  • Qual sua relação com a religião atualmente?
É uma relação pessoal com Deus. Não aceito totalmente as religiões . A meu ver, instrumentalizam, em seu todo ou em partes, a crença em Deus, visando benefícios próprios.
  • Como você compara a sua religiosidade daquela época com a atual?
Na época do Seminário, não se questionava quase nada. A religiosidade entrava pelos poros e era vivenciada intensamente por todos nós. Atualmente, com todas as informações do mundo atual, fica muito difícil acreditar em tudo que nos foi ensinado. Mas Deus continua presente, de uma forma bem pessoal.
  • Como você compara a Igreja Católica daquela época com a atual?
Acho que houve grandes mudanças com João XXIII e com Paulo VI. Parece que atualmente estamos de volta ao passado.
  • O que você acha dos reencontros com os ex-colegas do ex-SIC?
O reencontro é emocionante. Há uma carga muito grande de sentimentos que não conseguimos externar nos primeiros reencontros. São momentos gratificantes.
  • Alguma sugestão?
Sugiro que nos esforcemos para trazer colegas que ainda não participaram dos encontros.
Que todos participem desses depoimentos, para que possamos nos conhecer melhor, hoje.

 

Milton Luis De O. Martins

 

Aí está a trajetória do Milton, honorificamente apelidado de Palmeirinha.

Endosso plenamente o seu apelo para que nos esforcemos em trazer para os encontros (e/ou participar das atividades da comunidade) os que ainda não participaram.

Ajudem-nos a arrebanhar os "sumidos"..rsrsrs

Para os que já participam apelo a que façam seus comentários. Quaisquer que sejam serão sempre bem-vindos. Apenas não esquecer de identificar-se caso comente na qualidade de "anônimo".

Semana que vem tem mais. Até lá.

 J. Reinaldo Rocha(62-67) 

6 comentários:

  1. Palmeirinha,não, não era um time do bairro. Era o o apelido do Milton, que jogava por um time todo. Mas, assim como o Anilton Teberga, acho eles jogavam na seleção de médios porque eram pequenos. O Teberga ainda chegou a jogar na seleção de maiores quando o SIC já começava a se desmontar. Fica a dúvida se eram médios ou maiores. Acho que o Palmeirinha jogava de centro-médio(volante) n0. 5 e concorria com nada menos que o Boing, Raul. Mas qdo ele saiu eu estava chegando e ouvi muito falar do Palmeirinha, mas um ano não deu para curtir amizade. Interessante entrevista assim porque ele relembra detalhes que ilustram bem coisas pequenas mas importantes na vida da comunidade. Aquela enquete que nas férias a gente levava para o Pároco e depois trazia como uma caixinha de surpresa. A gente pensava: o que será que ele escreveu aí? Os padres vão abrir e mandar a gente embora.... O tal Martirilógio que se lia durante as refeições, fazia parte da vida dura até um pouco antes de 1965, qdo cheguei, mas ouvia o pessoal contar que comia ouvindo a leitura da vida de santos. Mas também ouvi que se lia também se lia Karl May e suas aventuras pelo mundo. Quem não leu aquela coleção do gremio? E interessante como sabemos agora que os padres até ajudavam o pessoal a sair do SIC. Mas era traumática as chamadas no estudo da noite: Ei...Monsenhor Bruno está chamando no quarto. E lá se ia mais um... De 1966 prá frente só Monsenhor Bruno mandava embora, ao contrário do que estavamos vendo agora, que o Ministro de Disciplina, o Vanin é o mais citado, também andou tirando o sono de muita gente.
    grego

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  2. Pelo período por voce citado, eu estava lá.
    Vagamente pelo seu apelido(PALMEIRINHA),mas era tão somente pelo futebol que me lembro.
    Quanto às suas respostas, gostei pela objetividade.

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  3. Eta, Palmeirinha, vc me traz tantas recordações do seminário! E éramos da mesma turma. Lembro-me até de sua carteira na sala de aula. Realmente vc era quietinho, mas vc acompanhava o raciocínio do Pe. Senna, muito bem!
    O Martiriologium romanum era lido no início do Jantar, assim que rezávamos (benedicite... benedicite)e sentávamos à mesa. Logo após, começava uma leitura instrutiva. O almoço tb era em silêncio, com leitura, exceto nas quintas-feiras e domingos, quando o padre ministro dava o "Deo gratias" e então podíamos conversar e gritar à vontade.
    Outra coisa: a preparação para sair, nunca houve. Bastava o garoto se interessar por datilografia... "Eh ce tá querendo sair, eh?" Pois é, mas a história tem o seu curso. Amei sua entrevista. Quero vê-lo no próximo encontro.
    Um abraço pirassunungamente quilométrico.
    Lúcio

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  4. Grande Palmeirinha,
    alegria grande de ler sua entrevista. Privilegiado em tê-lo como contemporâneo nos anos 61 e 62, suas respostas me fizeram relembrar os passeios à Fonte Sônia... (num deles bebí muita água numa das piscinas naturais, tendo sido resgatado não me lembro por quem). Me veio à memória ainda o Martirológio Romano que por você, pelo Grego e por mim, grafado em português. Já para o Lúcio o Martiriologium Romanum, com o todo o requinte da nossa língua mãe.
    Gostaria que me esclarecesse uma coisa, inesquecível Palmeirinha, passados quase 50 anos, quando não corremos mais nenhum risco de sanção por parte de qualquer superior: é fato ou lenda você ter levado sob a batinha numa procissão da catedral, seu radinho de pilhas para ouvir a transmissão de jogo no nosso querido Palmeiras? (rs).
    Que Deus continue abençoando sua vida e a dos seus familiares. E que Ele me permita o prazer de um dia poder lhe apertar a mão.
    Forte abraço
    José Fernando Crivellari
    fernando.crivellari@ig.com.br

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  5. Milton, gostei muito de sua entrevista, são memórias que querem se apagar mas voltam sempre. Mesmo se hoje não nos servem mais aqueles cerimoniais religiosos, aqueles hábitos disciplinares, eles nos impregnaram, como você disse, de uma crença em um ser supremo que faz de nós cidadãos conscientes. Na parte intelectual o ganho foi imenso. Você, na entrevista, trouxe-nos tantas vivências daquela época, com detalhes muitos dos quais, de minha parte, tinham escapado da memória. Foi tão gostoso recordar! Não se limitou ao que se passava dentro do seminário, trouxe o que sentíamos em férias nas paróquias. Muito interessante sua entrevista, mesmo para quem não passou pelo seminário. Parabéns!
    Carlos Beltrame de Oliveira

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  6. Crivelari

    Relembrando aqueles tempos, era-nos permitido ter radinhos de pilha para usarmos apenas em horários determinados pelos superiores.
    Tínhamos que guardá-los em um armário, no quarto do Pe. Vanin, que ficava no final da escada do hall.
    Os grandes jogos do Palmeiras eram, em geral, à noite, em horários em que já estávamos recolhidos nas "cameratas" para dormirmos.
    Meu rádio (HITACHI), tinha uma capinha de couro duro, toda fechada. Percebi que o Pe. Vanin não olhava os rádios do armário com muita atenção.
    Passei a deixar somente a capa em seu armário. O rádio era usado durante a noite, para ouvir os jogos. Os gols eram comunicados rapidamente de cama em cama. Pela manhã, ao descermos para a missa, o rádio voltava para dentro da capa! Até hoje não sei se o Pe. Vanin não percebia, ou fazia vista grossa!
    Quanto a ter levado o rádio para a procissão, sinceramente não me recordo.


    Abraços
    Milton

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