domingo, 18 de março de 2012

...em momentos de profundo sofrimento me esgueirava para a capela ou para a gruta para orar e chorar


Se você conheceu o “Lambari' logo saberá quem é o nosso entrevistado de hoje. 

Independente disto, poderá conhecê-lo melhor lendo até o final os desabafos e os desejos de re-encontros expressados por ele. E, quem sabe, você tenha a resposta para uma dúvida que ele carrega até hoje.
  • Quando entrou para o Seminário?
No final de 1.965, prestei o exame de admissão, tendo iniciado os estudos em 1.966
  • De que cidade/paróquia?
Campinas – Paróquia da Catedral
  • Por que entrou para o seminário?
Minha família sempre teve uma convivência muito grande com Sacerdotes, principalmente os padres Stigmatinos, e eu ainda tinha parentes, meu padrinho, um meio primo que eram sacerdotes, achava bonito, gostava da religiosidade ali transpirada e brotou o desejo de ser padre
  • Quantos anos tinha quando entrou?
Prestes a completar 11 anos
  • Quando saiu do Seminário?
No meio do ano de 1.970
  • Quantos anos tinha quando saiu?
15 anos completos
  • Por que saiu do seminário?
Até hoje não sei. Ainda outro dia questionei minha mãe a esse respeito e ela disse absolutamente não se lembrar de nada.
O que me lembro foi que ao final das férias de meio do ano Mons. Bruno, Pe. Faur e Pe. Canoas foram à minha casa. Fiquei feliz com aquela visita. Mas meus pais em um dado momento solicitaram que eu me retirasse da sala, assim o fazendo. Um tempo depois eles me chamaram as visitas já haviam se retirado e por meus pais fui informado que não voltaria ao Seminário. Nada mais me foi dito. Como eu gostava e muito do Seminário tinha sim o desejo de saber e para a minha idade, para a qualidade de verdadeiro “ TONTO – BOBO “ que eu era naquela época, busquei o Sr. José da secretaria para alguma informação. Sai como cheguei, ele disse nada saber. E pelo jeito ficarei assim.
  • O que aprendeu no Seminário?
Muitos foram os ensinamentos adquiridos e muitos somente bem mais tarde são entendidos. Mas uma forma minha, particular de orar, foi lá que adquiri em momentos de profundo sofrimento me esgueirava para a capela ou para a gruta para orar e chorar. Aprendi também como pode realmente algumas pessoas nos usarem de acordo com as necessidades. Ex. Eu não era dos “colegas” mais queridos, no entanto quando passei a ser semi-interno em virtude da possibilidade de estar todos os dias na rua, passei a ser um comprador de cigarros, então eu era aceito entre alguns, mesmo que a contra gosto. Aprendi ainda que o respeito às hierarquias devem ser seguidas e analisadas de forma observada e não discutida, aprendi a ter saudades de pessoas que para mim eram realmente caras e significativas, mas a recíproca não havia
  • O que faltou aprender?
Poxa que saudade, faltou aprender a fazer vasos, faltou aprender encadernação, eram locais que eu amava, mas que era admitido como visitante, tolerada a permanência de um espectador
  • O que fez depois que saiu? Estudou o que?
Fui para o Colégio Pio XII e depois fazer Contabilidade. Fui trabalhar e casar, meio a ordem “natural” das coisas
  • Qual sua trajetória profissional após a saída do Seminário?
Trabalhei em diversas empresas ate passar desde mais ou menos 1.990 a prestar Assessoria Tributaria e Financeira a clientes.
  • Trabalha ainda?
Sim. Continuo com minhas atividades de Assessoria e sou responsável por um setor da editora da ordem a qual pertenço
  • Casou? Tem filhos? Netos?
Casei-me em Maio de 1.977 me divorciando no mesmo mês de 1988. Tenho Um casal de filhos Luiz Gusthavo e Thais Roberta e um neto Lucas
  • Quais as recordações mais marcantes do tempo de Seminário? 
A disciplina ali aprendida a disciplina oferecida por alguns de nossos mestres, pelo menos à época o Pe. Faur era um exemplo, para mim era o homem correto, sempre com uma palavra acertada, o homem forte, Prof. Rui de ciências, não sei se por seu tamanho, mas era uma figura de respeito, o Pe. Daólio com seu modo singular de nos corrigir, falar, embora cite ex-padres, mas eram nossos mestres, eram sacerdotes e meio que ídolos. Mesmo rabugento Mons. Bruno era uma figura de ordem, era a figura do respeito e temor. Com imensa saudade lembro-me do Cônego Luiz, rabugento, bravo realmente, mas havia para comigo um grande carinho, me permitindo ajudá-lo a cuidar dos peixes e daí ganhei meu primeiro apelido no Seminário “ Lambari “. Marcam ainda as nossas refeições, de qualquer forma eram momentos de reunião de alguma liberdade extra de um papo, etc
  • Cite um personagem com quem conviveu na época e que o impressionou positiva ou negativamente. .
Absolutamente positivo o Faur, negativas são tantas as situações pessoas que deixaram marcas, mas que somente bem depois foram entendidas. Creio não valer citar nomes, mas como disse antes, a forma como sai do Seminário, ainda hoje é um mistério, então lá ficaram pessoas que me eram queridas, a recíproca... Busquei essas pessoas mais tarde, em Campinas, em outras cidades a maioria não encontrei, mas foi possível deixar um recado, um contato e nunca obtive uma resposta isto de colegas ou superiores, são coisas da vida e ela segue.
  • Sobrou alguma mágoa? Qual? .
Não creio ser uma questão de magoa, mas um triste sentimento pelas vivencias citadas.
  • Se voltasse no tempo iria novamente para o Seminário? Por que?
Voltar no tempo..............que delicia e sonho de muitos, valeria a pena voltar se me permitido fosse ter ao menos uma ínfima parcela de conhecimento dos acontecimentos. Então dentro desta condição digo:- jamais entraria para o Seminário, mas se voltar no tempo significar voltar a ser exatamente aquele BOBO daquela época, com certeza faria de novo.
  • Quais as principais mudanças que a entrada (e/ou saída) do seminário provocou em você?
A entrada foi uma satisfação imensa, pois foi uma conquista minha, ninguém me mandou ir para aquela escola, etc, desejei ir para o Seminário, prestei um exame, passei e “ CONQUISTEI”. A saída, bem ai as coisas mudam. De forma imperceptível fui passando a desconfiar das pessoas, passando a desconfiar das “autoridades”, que de forma absurda dispõe de nós como peões desnecessários em um tabuleiro de xadrez, aprendi e durante muito tempo ficou intimamente assumida a condição que podemos passar a ser um dejeto qualquer que basta acionar o botão de uma descarga e nos vemos livres dele, a saída muito dura. Somente bem mais tarde pude readquirir o meu equilíbrio de crer que posso conquistar, posso ser, posso ir.
  • Se dedica à Igreja  Católica atualmente?
Não
  • Qual sua relação com a religião atualmente?
Creio que sou um grande Cristão, perdoe a falta de modéstia, mas não necessito da “Igreja” para ser um bom homem, um bom Cristão. Mantenho praticamente todos os hábitos daquela época, pelo menos os que julgo saudáveis, mantenho minhas devoções, orações, meu terço, mas dentro de uma igreja que de uma forma egoísta talvez possa dizer, uma igreja que é minha.
  • Como você compara a sua religiosidade daquela época com a atual?
Uma religiosidade madura, posso ser um Cristão maravilhoso sem a necessidade de estar afundado dentro de uma Igreja ou das comunidades paroquiais, e assemelhados, creio sim ser muito mais religioso hoje, com um profundo e intimo desejo se servir, de ser, de estar só que à minha maneira.
  • Como você compara a Igreja Católica daquela época com a atual?
Depois do Seminário participei de comunidades paroquiais de jovens, TLC e outras afins, não passavam de ponto de encontro para outros compromissos, ostentação de trajes, poderes etc e os dirigentes não se preocupavam com estes fatos, era tudo “legal”, me afastei gradativamente desse meio, vi, testemunhei os absurdos desvios financeiros que ocorriam dentro da igreja, as necessidades que então eu julgava prementes de atendimentos, ficavam a ver navios. Hoje como disse estou fora do meio, mas convivo com pessoas que estão ali pelo meio, e sinto que nada mudou, a Igreja Católica não busca os crentes de alma de coração.muitos Sacerdotes se tornaram Pop Stars, são somente imensos templos sendo construídos mas o recheio..................
  • O que você acha dos rencontros com os ex-colegas dos Seminários de Campinas?
Somente fui convidado para um encontro que ocorreu em 1.977. Mas acredito ser bastante importante, significativo, ali muitos formaram laços e por conseguinte o prazer desses eventos deve ser muito grande. Observei pelas fotos no site a bela organização, a alegria, os momentos dedicados à preservação da religiosidade a importante presença e prestigio que D. Bruno ofereceu, enfim, creio que são muito bons
  • Alguma sugestão?
Não tenho como ter sugestões, somente quem sabe com o tempo.
  • Qual pergunta você gostaria de ter respondido e que não foi feita?
Creio que foi muito bem formulada esta entrevista, não sinto falta de nada, creio até que me excedi nas respostas.
  • Há algum outro endereço na internet que tenha mais informações sobre você? Algum "link" que você queira divulgar?
Meus endereços de contato eletrônico:- ziulmaram@hotmail.com e luizandrade@cinzeleditora.com.br
  • Alguma mensagem especial aos colegas da comunidade ex-SIC?
Tenho saudades de muitos, gostaria sim de rever, papear, mesmo com aqueles que um dia eu não consegui encontrar, ou atravessaram uma rua, ou “não estavam” a um telefonema meu.


Luiz Martins Andrade Filho


Assim conhecemos mais um de nossos colegas compartilhando suas dúvidas, suas emoções, seus sentimentos.

Valeu Andrade!

Agora só me resta conclamar os colegas a escreverem seus comentários, não esquecendo de identificar-se caso comentem como anônimos.

5 comentários:

  1. Martins, assim que o chamava. Muitas das suas dúvidas aqui muita bem expressadas durante anos tb foram as minhas. Mas graças a leitura do livro Adeus Seminário, escrito por Nosso amigo Grego, muitas dessas dúvidas me foram esclarecidas, recomendo a quem ainda não leu. Como vc tb sinto saudades do nosso tempo de seminário, já participei de vários encontros e lhe garanto, para mim são ótimos, me sinto muito bem junto aos nossos amigos. Martins vc perteceu a minha a classe e que estou com dificuldades de fazer contatos, tentei várias vzs mandar emails p/ vc mas o endereço estava errado, estou enviando os meus, sou de campinas, e como o Grego sabe batalhei bastante para encontrar ex sic para participarem dos encontros e me coloco a sua disposição. gostei da sua espontaniedade nas respostas.
    Mário Luiz Rosa.
    mariocampecas@gmail.com
    m.lrosa@hotmail.com

    ResponderExcluir
  2. O Luiz Martins, só conseguimos encontrar seu paradeiro há uns seis meses p.p e então entabulamos diálogos via e-mail e fiquei satisfeito de vê-lo entusiasmado em falar e participar de nosso trabalho de reencontro do ex-SIC. Apesar de as perguntas serem as mesmas para todos, e alguns se recusam a participar, imaginando cair em uma mesmice, notamos que cada um tem uma história ou pelo menos uma visão diferente, fatos pessoais e lembranças que, indiferentes serem boas ou ruins, são encaradas como pedaços de vida, tentativas de acertos, para encontrar caminhos e enfim, ser seminarista foi uma verdadeira aventura, no bom sentido. O Luiz chegou já no apagar das luzes da vida do SIC, mas ainda com as turmas intactas, mas já em processo de abertura, semi-internato para o pessoal da redondeza, apostolado em fins de semana, etc. A saída dele do SIC deu-se como a de vários que já nos reportaram, de maneira meio enigmática, então Luiz, não foi só "privilégio" seu...rs... A continuidade de sua vida também revela, espero que todos que nos acompanham tenham se interessado em tirar algum proveito dessas revelações, notar que a maioria dos ex-SIC, que teoricamente educados na religião deveriam ter seguido a mesma linha, se desviaram totalmente da Igreja, mas não por abandono, mas porque criaram o que me parece, umas consciência nova, uma visão mais madura de como ser um ser espiritual e religioso, mesmo não seguindo mais cultos, regras e mandamentos da Igreja, assim como você. Mas há muitos que ainda continuam praticantes e são felizes assim.... Obrigado pela sua aparição, em entender o nosso sentido fraterno criado dentro do ex-SIC e que tentamos preservar abrindo os braços à todos.
    Abraço
    Grego

    ResponderExcluir
  3. Caríssimo Luiz,parabéns pela espontaneidade das respostas, pelas quais revela que lhe ferem ainda a alma: 1)a forma como foi "usado" servindo a interesses de colegas da época; 2)a negativa até hoje das razões pelas quais foi "convidado" a deixar a vida do seminário; e 3) certo descaso de ex-colegas que lhe negam atualmente um contato para um bate-papo. Coloco-me à disposição para um relacionamento. Embora não seja privilegiado em ser seu contemporâneo, podemos sim relembrar senão os mesmos fatos, pelo menos, reavivar em nossas mentes experiências vividas cada um à sua época, mas que ajudaram a escrever a história do nosso SIC.
    Forte abraço
    José Fernando Crivellari
    (1961/1962)
    fernando.crivellari@ig.com.br

    ResponderExcluir
  4. Luiz Martins, Lambari, não o conheci, na sua época estava eu sem muito contato com o Seminário,mas de longe aconpanhava as experiências novas, de pequenos grupos, vivendo em casas,que parace não deu certo, coisa muito confusa que o Grego conta em seu livro. NA MESMA ÉPOCA VIVÍAMOS AS ANGUSIAS DE UMA DITADURA que nos perturbava e causou uma mudança muito grande em nossas vidas,mudança no mundo , na Igreja etc. ainda difícies de se compreender. Sua entrevista me deixou triste, Tive a impressão que te largaram no meio do mato sem cachorro e te vire...mas acho que Deus o protegeu. Espero que hoje esteje bem, pois afinal Deus nos quer felizes, Um abraço e até quem sabe, qualquer dia. Herminio: herminio35@gmail.com

    ResponderExcluir
  5. Olá, Luiz Martins, eu me chamo Lúcio, não me lembro bem do caro colega, nosso relacionamento era bem restrito, devido ser eu da recreação dos maiores e você ter pertencido à dos menores. Eu saí do Seminário de Campinas no final de l965, indo para o Seminário Central do Ipiranga. Portanto, convivemos pouco também. Depois que fui para São Paulo, não pude mais acompanhar o cotidiano do Seminário da Imaculada. Mas,... em questão de dúvidas eu sou bem diplomado, rs rs rs, nunca fiquei sabendo o porquê de minha saída, está bem relatada na minha entrevista. Só com a leitura do livro do Grego,já citado pelo Mário Rosa, que eu pude entender um pouco dos enígmas lá de dentro, isto porque o Grego mostrou ser um grande observador, bom filósofo e crítico, trazer à tona muitas dessas coisas que não chegavam até nós.
    Muito bem, gostei de sua entrevista, é assim mesmo, continue firme, vc está no caminho e com bastante consciência religiosa, com um passo a mais no amadurecimento da fé.
    Espero vê-lo no próximo encontro.
    Um abraço do Lúcio

    ResponderExcluir

Seu comentário é importante e bem vindo. Não esqueça de identificar-se.