sábado, 29 de maio de 2010

"Há lampejos de que a Igreja se aburguesou, e muito"

Mais uma entrevista de peso e que explica com detalhes uma trajetória muito comum a todos os ex-seminaristas.

Ele é um dos mais assíduos frequentadores e incentivadores da "Pizza do Paierão"(*)

O personagem tão detalhista e provocante?

Antonio Orzari

Preliminarmente agradeço a lembrança de me consultarem a respeito de minha vida no tempo do Seminário da Imaculada Conceição, em Campinas, onde estudamos.
  •   De que cidade/paróquia? Quando entrou para o seminário?
       Nasci em 1943, em Araras, com uma paróquia, Nossa Senhora do Patrocínio, dirigida desde a década de vinte por Orestes Paschoal Quércia (sim, tio do político). Em fins de 1960, criou-se a do Bom Jesus numa capela grande - cujo pároco foi Ângelo Pedro Longhi (ordenado em 1959), professor no seminário -, à qual passei a pertencer. Fui para o “Paierão” em 1956, frequentando antes, por dois anos, o seminário da Congregação do Verbo Divino, em Araraquara, cujos estudos prosseguiriam em Ponta Grossa, PR. Imagino que meus pais e meus padrinhos, os pais do AA(**), tenham levado em conta a distância de Ponta Grossa. O SIC foi a solução. 
  • Por que entrou para o seminário?
Nossos avós tinham uma propriedade rural no município de Araras, próxima à Fazenda São Jerônimo, pertencente a Limeira. A paróquia que cuidava da capela da fazenda era a de São Sebastião, então aos cuidados do padre Euclides Senna, que, na São Jerônimo, celebrava uma vez por mês. Dia de missa era uma festa (sorvetes, guloseimas para a criançada e, para os adultos, jogo de malha e bocha). Creio que lá nasceram minhas curiosidades de como me tornar padre. A partir daí, perguntado, respondia: vou ser padre. Os verbitas(***) percorriam o estado em busca de vocações e me descobriram, já morador em Araras.
  • Quando saiu do ex-SIC? Quantos anos tinha?
Completei o ex-SIC em 1961 e cursei o seminário de Aparecida, iniciando a Filosofia em 1962 indo até 1964. Apenas como lembrança: o curso do seminário menor era de seis anos, ampliado para sete logo após minha saída de Campinas. Imagino que a ampliação objetivou compatibilizar o curso com os laicos. Portanto, ao sair de Campinas, tinha 18 anos, de Aparecida, 21.
  • O que aprendeu e o que faltou aprender no ex-SIC?
Aprendi tudo, do pouco que sei. Mas, o que me calou profundamente foi a ânsia de saber e de aprender. E saber sempre mais... Graças ao internato do seminário. Isto foi ensinado pelos professores e superiores. Há que se salientar que grandes mestres nos orientaram, sobretudo no enfoque de aulas, ou seja, de aprendizado de ciências, línguas e de disciplina. Os muitos colegas vencedores, espalhados por este mundão, são a prova cabal da excelente formação acadêmica. Contudo, já que sua pergunta induz, creio ter faltado aprender e apreender a solidariedade, a compreensão, a cortesia e, sobretudo, a humildade, implícita para exercer de modo condigno o ministério. E até para se tornar cidadãos conscientes. Nunca fui humilde, mas metido, nariz arrebitado... No geral, as manifestações de humildade, na época, parecem-me, ao tempo decorrido, que eram, sobremaneira, hipócritas, pois a delação corria solta pelos corredores e quartos dos superiores. Subliminarmente, a máxima talvez fosse: confere causam aliquem (imputar a culpa a alguém). Desculpe a frieza.
  • Por que saiu do seminário?
1)   Do ex-SIC para iniciar o curso de filosofia em Aparecida em 1962. 2) Da filosofia, em fins de 1964, pois o período fora bastante conturbado. Saliento três motivos, sendo o terceiro conseqüência: a) a revolução causada na Igreja pelo Vaticano 2º - a mente dos alunos girava a 360º a cada dia; b) o 31 de março de 1964 nos desnorteou, deixando-nos órfãos, sobretudo porque uns professores se bandearam para a redentora, fazendo de suas aulas um púlpito dos intentos militares (do seminário víamos equipamentos passando pela Dutra a caminho do Rio de Janeiro em 31/03/64); você já parou para pensar o quanto esta dicotomia dos mestres nos prejudicou?; e c) a confusão mental gerada por a) e b). No calor das discussões intermináveis surgiram alguns ressentimentos, logo vencidos. Era difícil conciliar posições. Creio que o êxodo de seminaristas dos anos subseqüentes tenha origem nisso tudo. Todavia, há de se lembrar que muitos são os chamados e poucos os escolhidos. Nada acontece por acaso. Os três anos de Aparecida foram-me muito ricos. Aprendi, estudei, discuti muito e, sobretudo, abri-me para, e descobri, o mundo. Tivemos em 1962 o insubstituível reitor padre Miele (depois bispo auxiliar em Campinas), de visão de longo alcance e de diálogo permanente. O que haveria de melhor?
  • Estudou depois que saiu do seminário?
Sim. Todavia, lembro que foi celebrado um convênio com os salesianos, tornando-se o seminário de Aparecida uma extensão legal do curso de filosofia de Lorena a partir de l963. Quem se interessou prestou vestibular. Lorena forneceu alguns professores (Riolando Azzi, por exemplo) e tínhamos compromissos burocráticos a cumprir. Cursei dois anos na USP e fiz complementação pedagógica na UMC, onde fui professor posteriormente.  
  • Qual a trajetória profissional? Casamento e filhos?
Na extinta revista “Visão” iniciei em 02/01/1965. Trabalhei na “Folha de S. Paulo”. Fui para o meio editorial, tendo trabalhado em diversas editoras. Assumi em 1967 o Banco do Brasil após concurso em fins de 1965. Nunca tive vocação para bancário e saí após sete anos (pela saída do BB, a mãe quase deu à luz a mais um filho). Trabalhei na gerência de vendas na IMESP(****), cujo boss era o competente Arnosti. Havia prestado concurso para o TRT, onde me aposentei após dez anos. Não trabalho mais, leio muito, escrevo bobagens e estou preparando um dicionário latino de expressões jurídicas. E, é lógico, aqui em casa, já que... (quem não se aposentou vai descobrir o que é o já que). Casei-me em 1970 (continuo com a mesma digníssima). Filho único, 28 anos, solteiro, exercendo em Brasília a função de advogado do Senado.
  • Quais as recordações marcantes do ex-SIC?
Reporto-me às magníficas pessoas: a fleugma do monsenhor Bruno Nardini; a simplicidade do padre Lauro Sigrist; a humildade do padre José Gaspar; a santa inflamação política do monsenhor Luís Fernandes de Abreu; a bondade do padre Ângelo Pedro Longhi; a arguta inteligência do padre Euclides Senna; a sabedoria e modéstia do internacional belga padre José Comblin (o M. Alors: quando chegou ao Brasil nos dava aula de francês, em francês, não sabia português, e não entendíamos nada, conversávamos e ele, pacientemente, dizia para a classe: alors... alors...)
  • Qual personagem o impressionou positivamente?
O senhor José, secretário e porteiro do seminário. Organizado, atencioso e educado. Pudera, fora jogador da Lusa na década de 1930 e torcia por ela. Imagine por qual time eu torço...  Méritos ao monsenhor Bruno Nardini que o tirou da sarjeta.
  • Alguma mágoa?
Acho que todas estão expressas acima ou a seguir.
  • Voltaria para o ex-SIC?
Sim. Desde que nos parâmetros da época quanto a estudos; pois, parece-me, pelo que se vê, que os padres ordenados mais recentemente deixam a desejar intelectualmente. Além de imitarem a gestuália pentecostal, o que, smj, empobrece a Igreja.  
  • Quais as principais mudanças com a entrada e saída do seminário?
Creio que a entrada no seminário tenha me propiciado a possibilidade de estudos, pois lá no meio do mato onde nasci, ou mesmo na provinciana Araras, não teria quaisquer avanços intelectuais. Imagino que tal situação tenha sido recorrente a muitos co-seminaristas. A saída do seminário me propiciou a descoberta do mundo como um todo. Isto me foi benéfico. Lembro que antes de seguir, como os professores desejavam, para o curso de teologia pretendia ficar um ano fora (o tal do aggiornamento do Mundo Melhor). Fui aconselhado a ir conversar com o arcebispo de Campinas, Paulo de Tarso Campos, sempre visto como rígido e imponente. Recebeu-me muito bem em palácio, elogiando minha decisão. Nenhum dos dois cumpriu o acordo verbal. O combinado? Deixa pra lá...
  • Dedica-se à Igreja atualmente?
Não.
  • Qual sua relação com a religião atualmente?
Mínima ou quase inexistente; acredito em Deus, mas a ritualística atual me deixa perplexo, para dizer o mínimo. Quando dá na telha gosto de ir ao Mosteiro de São Bento, em São Paulo, participar da missa cantada em latim pelos frades. Entro em igrejas quando tenho vontade. Sou amigo de diversos padres e até de bispos - uma relação de amizade. 
  • Compare sua religiosidade da época com a de agora.
Uma pergunta: eu era religioso na época? Ou era medroso? Medo do pecado mortal, do venial, da transgressão, do regulamento, dos superiores, da nota baixa, da reprovação ao final do ano, de “segurar” a parede, de suspenderem a sobremesa ou de participar de jogos? Medo de tudo isso... Havia colegas que sofriam com tais angústias, principalmente no curso de filosofia. Sempre passei batido por tudo isso. Um dia, na catedral de Campinas, vi um padre atendendo confissão, próximo ao altar-mor. Isto há mais de quinze anos. Fui, ajoelhei-me e não sabia o que dizer. De repente o insight: padre, fiz de tudo na vida, menos roubar e matar. - Só isso, meu filho? Vá em paz e reze três... Então, desculpe-me, estou de mãos vazias nesta comparação.
  • Como você compara a Igreja da época com a atual?
Por desconhecimento da Igreja atual não tenho o que comparar. Há lampejos de que a Igreja se aburguesou, e muito.
  • O que você acha dos encontros dos ex-SIC? Alguma sugestão?
Magníficos e não podem ser interrompidos. Creio que neles se dá a comunhão, a comum união de ex-SIC. Portanto, já está sugerido.
  • Qual mensagem?
A todos: pax, lux et bene. E nunca se esqueçam de tomar mingau de aveia com purê de maça.


Aí está a trajetória do A. Orzari, aguardando seus comentários. E, caso comentem como anônimos, não se esqueçam de identificar-se.

J.Reinaldo Rocha(62-67)


(*) "Pizza do Paierão": Encontro dos ex-SICs da grande São Paulo que acontece, em média, a cada 40 dias.
(**) Os pais do AA a que ele se refere não são os fundadores dos Alcoólicos Anonimos, mas sim os pais do nosso colega Antonio Arnosti (NP)
(***) Verbitas- Missionários do Verbo Divino (Societas Verbi Divini, SVD): Congregação religiosa católica fundada em Steyl, às margens do rio Mosa nos Países Baixos, no dia 8 de setembro de 1875, pelo padre alemão Arnaldo Janssen (NP)
(****) IMESP: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo (NP)
NP: Nota do Publicador

sábado, 15 de maio de 2010

Apareceu a Margarida!

Hoje temos o depoimento da única mulher que consta da nossa lista de contatos. Ela foi uma das poucas, ou talvez a única leiga que trabalhou no ex-SIC. Leiam como foi sua interação com os "candidatos a padre"

Além do que ela nos conta abaixo, no encontro de 27 de março de 2010 foi revelado que ela introduziu a dança de quadrilha no ex-SIC. Lembro-me vagamente de uma destas danças. Imagino que o padre para o casamento foi fácil de arrumar. Já, a noiva... Não sei como resolveram a questão. Quem lembrar, nos conte...

Mas, vamos ao seu depoimento:

"Sou Margarida Mendonça Campos de Souza, pedagoga, viúva. 

Tenho um filho que está com 44 anos. Seu nome é Carlos Henrique. Em verdade ele iria se chamar Paulo Afonso, mas os meus alunos seminaristas, não gostavam do nome porque existia uma cachoeira com esse nome. Como eles não quiseram, nós trocamos para Carlos Henrique. Pode? 

Meu marido era José Carlos Campos de Souza, que aparece na foto que me foi enviada e faleceu em 1992. 

Eu sou santista e vim para Campinas em 1951. D. Paulo de Tarso Campos, o Arcebispo de Campinas, convidou meu pai para tomar conta da construção do Seminário que estava iniciando. Ele daria escola para meu irmão e para mim. Eu fui estudar no Instituto Educacional Ave Maria, hoje Colégio Ave Maria, no inicio da rua Barão de Jaguara. Meu pai já havia trabalhado com Dom Paulo em Santos, onde ele foi bispo. 

Nós inicialmente morávamos em umas casas, atrás do seminário. Certo dia Dom Paulo foi à construção e minha mãe ficou muito brava com ele. A casa era horrível e o lugar também. E o ponto final do ônibus era lá na Swift e até lá era um matagal mais alto do que nós. Eu tinha 15 anos e meu irmão 14. 

Minha mãe disse a dom Paulo que iria voltar para Santos . A gente tinha que ir por uma "picadinha" de terra e a pé até o ponto de ônibus. Dom Paulo então, nos levou para o Circulo Operário Campineiro, à rua Regente Feijó 1421. (hoje é um estacionamento) 

Estudei no Ave Maria até 1957 e em 58 me casei. 

As Irmãs Franciscanas do Coração de Maria, amavam meu namorado José Carlos, mas não podiam ter aluna casada. Fui terminar o Normal, no Colégio Cesário Mota. Quando me formei a diretora, Irmã Maria Benigna, convidou-me para dar aulas no Ave Maria, e a diretora do Cesário Mota também. Optei pelo Ave Maria, pois estaria voltando para casa. 

Lá conheci o Pe. José Gaspar, ficamos muito amigos e começamos a frequentar o seminário já inaugurado. Era por volta de 1962/63. Digo frequentávamos porque meu marido também frequentava, embora menos do que eu. 

Foi quando fui convidada a lecionar Boas Maneiras e Etiqueta aos seminaristas. Ele queria que eu fosse a figura feminina no Seminário, já que as outras eram freiras. Foi assim que fui ao Seminário. Sai quando fiquei grávida. Saí do seminário e do Ave Maria. 

Tenho excelentes lembranças e algumas poucas, não tanto. Tenho saudades, sim. Passeei com seminaristas, fomos a Campos do Jordão, e a vários passeios, várias vezes a Helvetia, Indaiatuba... Eu me sentia um pouco a irmã/mãe mais velha e mais nova. Mil coisas aconteceram. Esse parêntesis foi muito interessante."
"Com o tempo conto mais."

OK Margarida. Estamos aguardando mais...


Aproveitando o espaço que sobrou, farei alguns comentários sobre esta série de entrevistas/depoimentos:

1) Agradeço a todos que têm aceitado o convite para participar. Descobri que estas entrevistas/depoimentos têm tido um efeito além do que eu previra quando me propus a esta tarefa. Além dos comentários que são publicados, há alguns que são feitos por e-mail e encaminhados aos entrevistados. E o que se percebe é que as experiências vividas e relatadas são de grande valia a outros ex-SICs que vivenciaram experiências semelhantes e agora descobrem que não estavam/estão sozinhos. 

2) A partir desta edição será publicado no painel lateral o "placar das entrevistas". Quantos foram convidados, quantos aceitaram o convite, enviando as respostas e quantos já foram publicados. TODOS os que estão com o respectivo endereço de "e-mail" ativo na nossa lista de contatos serão convidados a participar. Portanto podem ir preparando as respostas, pois as perguntas básicas serão as mesmas. Tenho certeza que cada um tem uma história interessante, e opiniões idem, que contribuem para, ao final, ter formado um painel de como foi a evolução dos que passaram por aquele seminário.

3) Como há alguns colegas que são ansiosos por ler as entrevistas e não querem esperar 2 semanas pela sua publicação, nestas próximas 2 semanas estará disponível uma pesquisa no painel lateral. Peço que votem e escolham uma das opções. Bastam 2 cliques. Um na opção escolhida e outro no botão "Votar".

4) Podem utilizar a área de comentários para fazer perguntas aos entrevistados. Tenho certeza que eles não deixarão de responder. E podem, também, comentar as respostas. Se alguém não souber como postar o comentário envie uma mensagem para ex.sic.1955@gmail.com que nós a publicaremos em seu nome.

5) "fui ao enterro do meu amigo". O que isto tem a ver com nosso "blog"? Também não sei, mas o fato é que alguém chegou até ele procurando por esta frase. Como descobri isso? Consultando o "Google Analytics". É um relatório que mostra uma série de informações coletadas sobre os visitantes ao "blog" (e ao "site" também). Neste endereço (DashboardReport) postei uma cópia de um destes relatórios. Quem tiver curiosidade pode lê-lo na íntegra. Quem tiver mais curiosidade ainda pode pedir outras informações que talvez eu tenha como obter.

J.Reinaldo Rocha(62-67)

sábado, 1 de maio de 2010

"Eu tinha que ser padre para ser santo um dia"

Após termos lido (quem ainda não leu pode consultar o mês de abril no painel a direita) a história e opiniões de um representante dos anos 60 e outra dos anos 50, desta vez vamos conhecer alguém dos anos 70.
Ele fez parte de uma das últimas turmas do ex-SIC. Presenciou e viveu o fim de um modelo de seminário. Leiam, então, como ele reagiu a isso.
Sabendo haver leitores que fazem o exercício de tentar "advinhar" o entrevistado antes de ler até o final, também desta vez não vou decepcioná-los e a revelação do entrevistado estará apenas no final do texto.
Então, vamos lá:
  • Quando entrou para o ex-SIC?
1966 
  • De que cidade/paróquia? 
Campinas, Paróquia Nossa Senhora das Dores.
  • Por que entrou para o seminário?
Queria ser santo e na minha mente criança, os padres eram santos. Então, eu tinha que ser padre para ser santo um dia.
  • Quantos anos tinha quando entrou?
11 anos
  • Quando saiu do ex-SIC?
1974 
  • Quantos anos tinha quando saiu?
19 anos 
  • Por que saiu do seminário?
Eu queria mudanças. Era muito progressista, antes mesmo de surgir essa ala.  
Quando acabou a casa das freiras, tentei me juntar aos que sobraram, na época sob a reitoria do Pe. Júlio, mas ele não me aceitou de volta. Disse que eu tinha ideias muito revolucionárias para os padres "atuais" (da época).
  • O que aprendeu no ex-SIC?
Aprendi o mais importante. Aprendi a gostar de ler e de estudar. Essas duas coisas são responsáveis por tudo o que conquistamos na vida, pois, como disse Freud: "só a sabedoria dá o poder". Daí pra frente, você escolhe o seu caminho. Se tiver paciência, persistência e perseverança, chegará onde quer. 
  • O que faltou aprender? 
Um pouco mais de Latim e Grego. Para um arqueólogo é muito importante (rsrs). 
  • Você participou de uma das últimas turmas do ex-SIC. Na época, você se deu conta de que era o término de um modelo de seminário?
Sim. E ainda que quase ninguém sabe, tentei uma última jogada conversando na época com Dom Antônio Maria Alves de Siqueira, bispo em 1973/4. Quem me levou até ele foi o Pe. Canoas. O bispo estava em férias em Helvétia. A nossa conversa foi interessante e eu, naquele ano consegui a permissão dele para estudar Ciências Exatas no lugar de Filosofia, desde que fizesse Teologia também. Foi por isso que entramos no curso que era ministrado pelo Seminário São Francisco em Nova Veneza. Naquele ano, prestei UNICAMP concorrendo ao curso de Química. 
  • Quais transformações ocorridas mais o afetaram? Por que?
As mais importantes foram a disciplina e a organização. Eram coisas obrigatórias. Mesmo assim tínhamos as nossas quebras de regras. Os padres sabiam disso e o Monsenhor Bruno, principalmente. Ele sabia muito bem dosar a rigidez com a maleabilidade. Foi um grande educador. Mas não posso deixar de lembrar também do Padre Faur. Nos ensinou a Bíblia usando a lógica e explicando, cientificamente os mitos. Como ele me disse uma vez, "a regra é para todos", e ele as cumpria.
  • E hoje, como você vê isso numa perspectiva histórica?
Infelizmente vejo uma degeneração da educação. A substituição do Positivismo pelo Construtivismo levou o ensino e a educação à uma total degeneração. Ao mesmo tempo que sentimos orgulho do conhecimento angariado nessa nossa jornada interna, percebemos o quanto nos distanciamos dos jovens atuais. Hoje temos alunos na universidade semi-analfabetos e sem o menor interesse pela leitura. O avanço tecnológico pegou muitos atalhos deixando o aprendizado do fundamental e do médio dilacerado o que reflete na postura do jovem atual e no atraso da sua maturidade
  • O que fez depois que saiu? Estudou o que?
Fiz muitas coisas. Estudei vários segmentos da ciência e trabalhei em empresas multinacionais e nacionais. Fiz Publicidade e Propaganda, Marketing, me especializei em Psicoterapia e Psicologia Junguiana, desenvolvendo alguns trabalhos junto à Saúde Mental na UNICAMP. Estudei Arqueologia na USP, para formalizar algumas descobertas feitas através da SIFETE - Pesquisa Científica, instituto de pesquisas que fundei em 1975. 
  • Qual sua trajetória profissional após a saída do ex-SIC?
Trabalhei na IBM Brasil, na área de publicidade e marketing desenvolvi trabalhos e criei empresas, como a Microcampo, por exemplo, fui para a Johnson & Johnson, montei uma agência de Publicidade, e hoje, presto consultoria, publico livros e leciono na Universidade.
  • Trabalha ainda? 
Sim. Há ainda muitas coisas a fazer. 
  • Casou? Tem filhos? Netos? 
Casei e tenho dois filhos. O menino é arquiteto e a menina é Farmacêutica Bioquímica. Netos ainda não tenho.
  • Quais as recordações mais marcantes do tempo de ex-SIC?
Parece um contrassenso, mas era a liberdade. Apesar de toda aquela disciplina éramos livres nas nossas farras e diabruras. Talvez porque existisse uma cumplicidade ímpar entre nós. Além do mais, tínhamos amigos muito especiais, que apesar do tempo, conservamos em nossos corações, pois tais laços não se desfazem jamais. 
  • Cite um personagem com que conviveu na época que o impressionou positiva ou negativamente.
O Pe. Faur me impressionou positivamente. Eu o admirava muito e era meu confessor. No dia em que soube da sua desistência como padre, confesso que fiquei passado, mesmo sabendo que era uma opção esperada de muitos. 
Me impressionavam também o trio Gessé, Trevisan e David, quando, após o jantar, iam para a última sala de aula do andar de cima, para tocar e cantar. Eu sempre ia também para ouvir e assistir. Me lembro sempre da guitarra vermelha que o David fez, peça a peça, e do violão do Jessé com enfeites de metal. 
O único que me impressionou negativamente, e que foi uma decepção geral para muitos, foi o Prof. Aparecido, quando descobriu-se que ele tinha desvios pedófilos.  
  • Sobrou alguma mágoa? Qual? 
Mágoa? Não. Nenhuma. Apenas orgulho e saudade de um tempo em que fui muito feliz. .
  • Se voltasse no tempo iria novamente para o ex-SIC? Por que?
Sem dúvida que iria. Por quê? "Porque eu era feliz e sabia."
  • Quais as principais mudanças que a entrada (e/ou saída) do seminário provocou em você?
A entrada me deu perspectivas de vida, pois como muitos, era muito pobre e tinha pouca chance de uma educação tão boa. A saída me mostrou quantas portas estavam a minha espera para serem abertas usando todo o vasto conhecimento que tinha armazenada durante aqueles 9 anos.
  • Se dedica à Igreja  Católica atualmente?
Não. Como vimos os bastidores de perto e vivemos toda a sua produção, preferi não atrapalhar o público das sessões seguintes tecendo, inadvertidamente, alguns comentários impróprios.
  • Qual sua relação com a religião atualmente?
Respeito todas elas. Acho que cada um tem direito de aceitar seus dogmas como bem quiser.
  • Como você compara a sua religiosidade daquela época com a atual?
Hoje sou mais lógico, mais racional. Não sei se isso é bom, pois sabemos que a crença traz resultados surpreendentes. No entanto, aprendi que o nosso inconsciente é quem tem o poder dos milagres. Fica mais distante conseguir algum, mas acaba sendo mais fácil aceitar os erros. Pelo menos não precisamos culpar Deus pelas nossas derrotas.
  • Como você compara a Igreja Católica daquela época com a atual?
Acho que a Igreja perdeu muito do seu poder, pois seus dogmas, bem propagados é que mantinham a fé do povo. Hoje a Igreja promove uma corrida em  prol da conquista de público. Briga o tempo todo com a concorrência e ainda coloca um pontífice sem carisma algum para regê-la.
  • O que você acha dos reencontros com os ex-colegas do ex-SIC?
Espetacular. Foi uma iniciativa fenomenal do Jorge, lá atrás e que foi encabeçada pelo Grego a partir de então a quem não podemos jamais deixar de agradecer e elogiar.
  • Alguma sugestão? 
Talvez tenha alguma mais pra frente. Mas manterei o blog informado.
  • Qual pergunta você gostaria de ter respondido e que não foi feita?
Não sei dizer. Mas se tiver novas perguntas, terei prazer em responder.
  • Alguma mensagem especial aos outros ex-SIC?
AMIGO 
 
O mundo se abre agora.
No caminho a vista se apaga.
Um amigo vai-se embora,
e é a saudade quem me afaga. 
 
Mas no mar, a água da vida,
no céu estrela a cintilar.
Quem sabe um dia, essa ida,
faça a felicidade brilhar? 
 
Se a meta for difícil,
não tente se esquivar.
Não deixe nenhum resquício,
há sempre um amigo pra ajudar. 
 
Na reviravolta da vida
jamais sinta indecisão.
Aqui tem a mão amiga
pra te dar força e atenção.
Como diz aquela cantiga,
amigo é mais que um irmão. 
 
Se do outro lado da história
olhares para o passado,
procura na memória,
talvez um amigo já apagado,
mas que te deseja vitória. 
 
Um dia rimos bastante
daquela piada constante.
Já sinto no coração,
como se fosse um barbante,
a saudade me apertando.
Um suor que vem brotando
na fronte, no rosto e na mão. 
 
Amigo, corre pra vida.
Vencer sempre é a tua visão.
Levanta a estrela caída,
que ela há de brilhar em tua mão. 
 
E na força desse teu gosto,
olha pr’aquele álbum antigo
e faze acender em teu rosto
a certeza de ter um amigo. 
Omar Carline Bueno
Aproveitem para comentar, fazer perguntas, concordar, discordar, etc. Só peço que, se forem comentar como anônimo, não esqueçam de identificar-se.
 Aguardo os comentários de vocês
J. Reinaldo Rocha
OBS:
1) Vocês podem encontrar mais informações sobre o instituto de pesquisa a que o Omar se refere aqui: SIFETE - Pesquisa Científica. Este "link" também faz parte da relação de "Sites e blogs amigos" que pode ser vista no painel lateral direito do nosso "blog".
2) A medida que as entrevistas forem sendo publicadas, os respectivos "links" das publicações estarão na seção "Personalidades" do nosso "site" (experimente clicar aqui), coluna "Mais Informações".